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Estátuas de Marx em Trier, Alemanha. | Foto por Hannelore Foerster/Getty Images

Oito afirmações marxistas que podem te surpreender

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Tradução
Rapha Klass

Críticos de Marx não costumam entender o grande pensador socialista. Estamos aqui para acertar as contas.

Há muitas formas de se interpretar Marx, várias delas legítimas. Porém, outras buscam reduzi-lo, invocando uma retórica anticomunista. Zombam dele como se fosse um determinista econômico estéril ou detonam suas análises e previsões como se horripilantemente errôneas.

Marx nem sempre esteve certo (e quem está?). Entretanto, ele esteve certo ou afirmou coisas defensáveis com mais frequência do que a maioria das pessoas percebe. Vale a pena prestar mais atenção.

Portanto, com o objetivo de refutar algumas das representações mais superficiais do grande pensador socialista, aqui estão oito afirmações que deveriam estar inclusas em qualquer interpretação respeitável de Marx ou do Marxismo.


1.

Marx não dispensava simplesmente o capitalismo, estava impressionado por ele. Ele argumentou que é o sistema mais produtivo que o mundo jamais viu.

“A burguesia, em seu reino de apenas cem anos, criou forças produtivas mais massivas e mais colossais do que todas as gerações passadas juntas. Sujeição das forças da Natureza ao homem e ao maquinário; aplicação de química à indústria e à agricultura; navegação à vapor; ferrovias; telégrafos elétricos; desobstrução de continentes inteiros para o cultivo; canalização de rios; populações inteiras invocadas do chão – que século anterior tinha sequer um pressentimento de que tais forças produtivas dormiam sobre o colo do trabalho social?”

2.

Marx previu com precisão que o capitalismo criaria o que hoje se entende por globalização. Ele viu o capitalismo criando um mercado global onde as nações se tornariam cada vez mais interdependentes.

“A burguesia, através da sua exploração do mercado global, deu um caráter cosmopolita à produção e ao consumo em todos os países. Para o imenso desgosto dos Reacionários, ela tirou de debaixo dos pés da indústria o solo nacional em que ela se encontrava. Todas as velhas indústrias nacionais foram destruídas ou estão sendo destruídas diariamente…

No lugar do antigo isolamento local e nacional e da autossuficiência, temos relações em todas as direções, interdependência universal das nações.”

3.

Ao contrário das sociedades passadas, que tinham a tendência de conservar tradições e seus modos de vida, o capitalismo prospera com a invenção de modos de produção novos e alternativos que afetam o nosso viver. As tecnologias mudam nossas vidas a uma velocidade ainda maior. Produtos velhos devem abrir caminho para produtos novos (e para aqueles que os produzem).

Apesar dos capitalistas retratarem isso como se fosse puramente bom, pode ser algo profundamente inquietante, mesmo que certas mudanças sejam positivas. Pode levar as pessoas a sentirem que seus valores e modos de vida não têm mais lugar no mundo – que estão vivendo como madeira morta. Além disso, o emprego de novas tecnologias e métodos de produção na busca de lucro para poucos pode levar a consequências imprevistas. (Em nosso tempo, sem dúvida Marx indicaria a mudança climática como consequência do capitalismo desenfreado.)

“A burguesia não pode existir sem constantemente revolucionar os instrumentos de produção e, assim, as relações de produção, e com elas todas as relações da sociedade…Revolução constante da produção, perturbação ininterrupta de todas as condições sociais, incerteza e agitação sem fim distinguem a época burguesa de todas as anteriores. Todas as relações fixas e ultracongeladas, com o seu leque de antigos e veneráveis preconceitos e opiniões, são varridas; todas as novas formadas tornam-se antiquadas antes de poderem ossificar. Tudo o que é sólido se desmancha no ar, tudo o que é sagrado é profanado, e o homem é finalmente obrigado a encarar com sentidos sóbrios suas reais condições de vida e suas relações com sua espécie.”

4.

Empresas poderosas, concentrações de riqueza e novos métodos de produção tornam cada vez mais difícil que profissionais independentes e comerciantes de classe média consigam manter seu status. Eles acabam ficando com o conjunto de habilidades errado ou trabalhando para as empresas que acabaram com os seus tipos de negócio. Em outras palavras, Marx antecipou a Walmartificação das sociedades capitalistas.

“Os estratos mais baixos da classe média – os pequenos comerciantes, lojistas e comerciantes aposentados em geral, os artesãos e camponeses – afundam-se gradualmente no proletariado, em parte porque seu capital diminuto é insuficiente para a escala na qual a Indústria Moderna progride, e são inundados na competição com os grandes capitalistas, e em parte porque sua habilidade especializada é inutilizada por novos meios de produção.”

5.

Marx não defendia a abolição de todas as propriedades. Ele não queria que a grande maioria das pessoas tivesse menos bens materiais. Ele não era um utopista anti-materialista. O que ele se opunha era à propriedade privada – as vastas quantidades de riqueza concentrada pertencentes aos capitalistas, à burguesia. Inclusive, no final da passagem abaixo, ele e Engels ironicamente acusam o capitalismo de privar as pessoas de sua “propriedade auto-conquistada”.

“A característica distintiva do comunismo não é a abolição da propriedade em geral, mas a abolição da propriedade burguesa.  Mas a propriedade privada burguesa moderna é a expressão final e mais completa do sistema de produção e apropriação de produtos, que é baseado em antagonismos de classe, na exploração dos muitos pelos poucos.

Nesse sentido, a teoria dos comunistas pode ser resumida numa única frase: Abolição da propriedade privada.

Nós comunistas temos sido acusados de desejar abolir o direito de adquirir pessoalmente a propriedade como fruto do trabalho de um homem, cuja propriedade é supostamente a base de toda a liberdade pessoal, atividade e independência.

Propriedade duramente conquistada, adquirida por si, auto-conquistada! Você quer dizer a propriedade do pequeno artesão e do pequeno camponês, uma forma de propriedade que precedeu a forma burguesa? Não há necessidade de abolir isso; o desenvolvimento da indústria já o destruiu em grande parte e segue o destruindo diariamente.”

6.

Marx achava que os seres humanos têm uma inclinação natural a se sentirem conectados aos objetos que eles criaram. Ele chamava isso de “objetificação” do trabalho, com o que ele queria dizer que colocamos algo de nós mesmos em nosso trabalho. Quando um indivíduo não consegue se conectar com a própria criação, quando se sente “externo” a ela, isso resulta em alienação. É como se você esculpisse uma estátua e alguém a tirasse de você, e você nunca mais tivesse permissão para vê-la ou tocá-la novamente. Marx argumentou que os trabalhadores estavam em uma posição parecida nas fábricas capitalistas do século XIX.

“O que, então, constitui a alienação do trabalho?

Primeiro, o fato de que o trabalho é externo ao trabalhador, ou seja, não pertence à sua natureza intrínseca; que em sua obra, portanto, ele não afirma a si mesmo, mas nega a si mesmo; não se sente contente, mas infeliz; não desenvolve livremente sua energia física e mental mas mortifica seu corpo e arruína sua mente. O trabalhador, portanto, apenas se sente ele mesmo fora de seu trabalho, e em seu trabalho se sente fora de si mesmo. Ele se sente em casa quando não está trabalhando e, quando está trabalhando, não se sente em casa. Seu trabalho, portanto, não é voluntário, mas coagido; é trabalho forçado.”

7.

Marx queria que nos libertássemos da tirania da divisão do trabalho e das longas jornadas de trabalho, que impedem os indivíduos de desenvolver diferentes tipos de capacidades e talentos. Nos tornamos servos de um único tipo de atividade e outras de nossas dimensões são subdesenvolvidas.

“Pois assim que a distribuição do trabalho ocorre, cada homem tem uma esfera de atividade particular e exclusiva, que é imposta a ele e da qual ele não pode escapar. Ele é um caçador, um pescador, um pastor ou um crítico, e deve permanecer assim se não quiser perder seus meios de subsistência; enquanto na sociedade comunista, onde ninguém tem uma esfera de atividade exclusiva, mas cada uma pode se realizar em qualquer ramo que desejar, a sociedade regula a produção geral e, assim, possibilita que eu faça uma coisa hoje e outra amanhã – caçar pela manhã , pescar à tarde, criar gado à noite, escrever críticas após o jantar, como eu tiver em mente, sem nunca me tornar um caçador, um pescador, um pastor ou um crítico.”

8.

Marx não era um determinista econômico bruto. A forma com que as pessoas pensam e agem importa. Em uma carta escrita por Engels, ele enfatizou a importância da economia, mas tentou deixar claro que ele e Marx foram mal interpretados (por culpa deles mesmos, parcialmente).

“Marx e eu somos ​​parcialmente culpados pelo fato de que as pessoas mais jovens às vezes colocam mais ênfase no lado econômico do que é devido a ele. Tivemos que enfatizar o ponto principal em relação aos nossos adversários, que o negavam, e nem sempre tivemos tempo, local ou oportunidade de dar a atenção devida aos outros elementos envolvidos na interação. Mas quando se tratava de apresentar uma seção da história, ou seja, fazer uma aplicação prática, era uma questão diferente e não havia permissão para erros. Infelizmente, porém, acontece com muita frequência que as pessoas pensam que entenderam completamente uma nova teoria e podem aplicá-la sem mais delongas a partir do momento em que assimilaram seus aspectos principais, e mesmo estes nem sempre corretamente. E não posso isentar muitos dos “marxistas” mais recentes dessa censura, pois as besteiras mais surpreendentes também foram produzidas neste último trimestre…”

Sobre os autores

é professor de filosofia na Manhattan College.

Cierre

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Published in Análise, Capital, Ecologia and Economia

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