Nelson Mandela nasceu neste dia em 18 de julho de 1918. Em 1990 foi condecorado com o “Prêmio Lênin da Paz” (Prêmio Internacional Lênin da Paz), logo antes da dissolução da União Soviética. Por estar preso na África do Sul na época, no último dos 27 anos de um longo cárcere, a entrega só ocorreu em outubro de 2002, a pedido do próprio Mandela. Para celebrar sua história e trajetória de luta, publicamos na íntegra o discurso feito por Mandela ao receber em mãos a medalha. A versão original do discurso, em inglês, pode ser lida na página da Fundação Nelson Mandela.
É rara a oportunidade de finalmente poder receber uma homenagem que havia sido concedida há muito tempo, em circunstâncias, e por instituições, que desde então foram radicalmente alteradas. Estou profundamente comovido por esta ocasião de finalmente receber em pessoa o Prêmio Lenin da paz.
Muita coisa mudou no mundo desde que esse prêmio nos foi concedido, mas a necessidade para o mundo da solidariedade humana, que esse gesto generoso demonstra, permanece tão urgente como sempre. É nesse espírito que recebo esse prêmio, e me honra muito aceitá-lo.
Somos lembrados novamente da dimensão internacional de nossa luta contra o apartheid. Como poucas outras lutas de libertação, a nossa contou com o apoio de praticamente todas as persuasões políticas no mundo inteiro. A aversão do mundo à indignidade e desumanidade da opressão racial foi tal que se identificou com a luta de toda a humanidade.
Nesse apoio internacional à nossa luta, destacaram-se a União Soviética e outros países socialistas. Os governos e os povos do bloco socialista deram apoio material, moral e político à nossa luta de uma maneira e numa escala que nunca poderemos retribuir.
O mundo mudou desde então, e a União Soviética e os demais estados socialistas da Europa Oriental desapareceram. Não cabe a nós lamentar os desenvolvimentos que o povo desses países desejou. Também não nos cabe, no entanto, negar o valor do apoio que recebemos desses países ou disfarçar a imensa estima que tivemos por eles.
O fato de recebermos o Prêmio Lenin em circunstâncias tão radicalmente alteradas pode, de fato, simbolizar o espírito revolucionário a que ele se destinava. Pode muito bem inspirar-nos, no espírito de Lenin, a adaptar radicalmente nossos métodos às novas circunstâncias e a procurar o melhor para as massas populares, em vez de nos apegar desesperadamente a receitas preconcebidas.
Como lembramos do apoio da União Soviética e dos estados socialistas, é justo que também prestemos homenagem à nossa histórica parceria com o Partido Comunista da África do Sul.
Recordamos como os comunistas sul-africanos ofereceram apoio material ao Congresso Nacional Africano (ANC) em um momento em que a polícia invadia nossos escritórios quase diariamente, nos privando dos recursos para pagar nossos funcionários. Nunca poderemos esquecer desses atos concretos de solidariedade.
Os comunistas têm sido aliados confiáveis ao longo de décadas, como parte de nosso movimento em todas as suas formações. Nosso relacionamento com a União Soviética e com o mundo socialista tinha muito a ver com a presença deles em nossas fileiras.
Ao recebermos hoje o Prêmio Lenin, fazemos isso em celebração à solidariedade humana. Em um mundo em que os pobres parecem ficar cada vez mais pobres, e a divisão entre os que têm e os que não têm está aumentando, precisamos de um compromisso global com o valor da solidariedade humana.
Os métodos e abordagens para alcançar um mundo mais igualitário podem ter mudado. Os problemas da desigualdade bruta e da pobreza permanecem. Comprometamo-nos todos a construir um mundo onde haverá uma vida melhor para todos.
Eu vos agradeço pela honra de receber um prêmio que leva o nome de um revolucionário que a história jamais poderá esquecer. Eu vos agradeço.
Sobre os autores
advogado, líder rebelde e presidente da África do Sul de 1994 a 1999, considerado como o mais importante líder da África Negra. Vencedor do Prêmio Nobel da Paz de 1993.