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Manifestantes protestam contra queimadas e pelo impeachment de Bolsonaro. Foto: Adriano Machado / Reuters.

“A emergência climática é a história do colonialismo e do capitalismo”

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O sociólogo e professor da Universidade da Pensilvânia, Daniel Aldana Cohen, fala sobre o projeto do Green New Deal à Jacobin Brasil, um programa ecossocialista radical, que por sua natureza não aceita a separação entre luta social e ambiental - e se funda na mobilização da classe trabalhadora e dos movimentos sociais.

UMA ENTREVISTA DE

Aline Klein & Hugo Albuquerque

Para falar sobre isso e as tarefas emergenciais da classe trabalhadora para garantir um futuro no qual justiça social e ambiental só podem andar juntas, conversamos com o sociólogo e professor da Universidade da Pensilvânia, Daniel Aldana Cohen, um dos autores de Um planeta a conquistar: a urgência de um Green New Deal (Autonomia Literária, 2021).

Aldana Cohen é canadense, mas de ascendência latino-americana por parte da mãe e judaica por parte de pai, o que não é um mero detalhe biográfico: sua família materna esteve envolvida no processo revolucionário da Guatemala, golpeado ainda nos anos 1950 — o que valeu a perseguição de muitos dos seus entes queridos –, enquanto da parte paterna, fica a tradição de resistências e a memória de tantos morticínios ao longo do tempo. Por isso, a ideia de um apocalipse climático não lhe parece um exagero ou algo distante. 

O programa de um Green New Deal, portanto, deve recusar o capitalismo e ir além de visões ambientalistas elitistas, que não são insensíveis às demandas da classe trabalhadora e dos movimentos sociais — sem os quais é simplesmente impossível imaginar uma mudança de paradigmas.

Por sinal, Aldana Cohen guarda muito mais que um português fluente da sua estadia no Brasil, mas a própria experiência de diálogo e pesquisa sobre a práxis dos movimentos de moradia de São Paulo, que mesmo sem pautar a questão ambiental diretamente, faziam isso objetivamente na sua luta. É preciso pensar em alternativas de reconversão das tecnologias existentes, envolvendo e mobilizando as pessoas concretamente.


AK/HA

Olhando para os autores de Um planeta a conquistar, do qual você é coautor, muitos de vocês têm origens variadas, inclusive você que é em parte latino-americano e tem ligações com o Brasil. Como isso ajudou vocês a pensar as questões do livro? 

DC

Somos quatro autores: Kate Aronoff, Alyssa Battistoni, Thea Riofrancos e eu, portanto três, felizmente, são mulheres — caso contrário, acredito que não teria dado certo! Uma das coautoras, Thea Riofrancos, é filha de um argentino e há muitos anos que estuda América Latina — e fez seu doutorado na Bolívia e no Equador estudando extrativismo e agora se dedica a estudar a economia do Lítio, no Chile.

Eu sou canadense e minha mãe é guatemalteca. O imperialismo americano se fez muito presente na história da minha família. O tio da minha mãe se chamava Carlos Aldana. Ele foi ministro da infraestrutura do governo progressista de Jacobo Arbenz na Guatemala, que sofreu um golpe de Estado orquestrado pelos Estados Unidos. Com muita sorte, meu tio conseguiu fugir do país e nunca mais saiu de casa. A irmã de meu avô foi casada com o dirigente do Partido Comunista, José Manuel Fortuny, o autor da lei de reforma agrária que causou o golpe — ele também fugiu do país e nunca mais conseguiu voltar. 

Portanto, eu cresci em Toronto, em uma família cheia de anti-imperialismo e conhecendo os horrores do genocídio, seja na Guatemala ou na Europa, por conta da origem judaica do meu pai. Quando eu encontrei a ciência da mudança climática, a noção do perigo de um apocalipse não era difícil de compreender, justamente porque com as experiências da minha família, eu sempre soube o quanto as coisas podem piorar.

Eu não tinha muito interesse em estudar a Guatemala, pelas próprias questões familiares. Para mim se tratava de um tema quase claustrofóbico, mas passei muito tempo em outras partes da América Latina; um período como jornalista na Bolívia, estudando os movimentos de água e os cocaleiros em Cochabamba. No meu doutorado estudei os movimentos de moradia em São Paulo e Nova Iorque.

Esse período teve um impacto muito grande na minha formação. Logo no início, eu notei que os movimentos de moradia em São Paulo não discutiam diretamente a questão ambiental, ao mesmo tempo em que defendiam o direito da classe trabalhadora — e especialmente de mulheres negras — de morar no centro da cidade, perto do trabalho, do transporte público e de serviços de saúde.

Mesmo que hoje exista um discurso usado pelas elites globais defendendo “cidades verdes”, esse é na verdade o tema da reforma urbana no Brasil, do ponto de vista dos movimentos de moradia em São Paulo e outras cidades. Basta ver os conflitos entre ambientalistas que queriam projetos como o antigo  projeto Nova Luz em São Paulo, que nada mais é do que um redesenho verde da cidade para atender a burguesia, contra os movimentos de moradia — os quais são os protagonistas na luta por baixas emissões de carbono, mesmo sem ter como pauta o meio ambiente, afinal, a cidade verde é exatamente o direito do trabalhador viver perto do seu local de trabalho, de serviços e cultura, eliminando a necessidade de passar horas em locomoção.

A minha visão de justiça climática em lugares em que ela é pouco tratada veio a partir da minha experiência estudando e militando com os movimentos de moradia em São Paulo. 

AK/HA

Nos fale mais sobre a questão habitacional brasileira…

DC

Os imóveis causam muitas emissões por si só, especialmente nas cidades do hemisfério norte onde existe calefação, mas no Brasil o problema principal das cidades é a poluição causada essencialmente pelo transporte, que é fruto direto do tempo de deslocamento de casa para o trabalho, então os temas de moradia, transporte e salário caminham juntos.

Isso quer dizer que as etiquetas verdes são só uma categoria cultural. Em qualquer grande cidade brasileira há muitas pessoas fazendo uma correlação entre estilo de vida e o meio ambiente, como se consumir orgânicos, andar de bicicletas do Itaú ou amar a natureza tornasse a pessoa uma ambientalista. Essa categoria de ambientalismo é apenas uma categoria cultural, e que não está correta, a alternativa a isso seria pensar  qual é a relação objetiva de uma pessoa, mais principalmente de um grupo social, com o meio ambiente.

Se pensamos em moradia, transporte e modelo de cidades, podemos colocar em prática todas as pautas da reforma urbana. Transporte público para todos, proximidade da residência com o local de trabalho, acesso a serviços de saúde e educação que, particularmente, são setores essencialmente de baixo carbono. A partir daí podemos ver que de fato o de que os movimentos de esquerda contra o livre mercado e por direito sociais são objetivamente parte de uma luta ambiental.

Na minha pesquisa analisei o contraste nas cidades entre, ecologia de luxo e ecologia democrática. O Nova Luz em São Paulo se encaixa nessa ideia de ecologia de luxo adotada por setores  da burguesia pós-industrial e cultural, como IBM ou o Instituto Moreira Salles. Ele significa deixar os espaços mais verdes somente para a elite. O contrário disso seria a ecologia democrática, onde podemos combater ao mesmo tempo as mudanças climáticas, as diversas opressões, as emissões de carbono e as desigualdades. 

AK/HA

Por que os trabalhadores brasileiros deveriam se interessar pelo Green New Deal?

DC

O Green New Deal é uma política para o meio ambiente, mas é igualmente uma política de transformação econômica. Isso é muito importante especialmente com a pandemia global, pois vivemos um choque econômico — e teremos que fazer as economias do mundo retomarem seu rumo. A questão será como isso se dará: vamos começar da mesma forma que no século XX ou de uma forma mais moderna, igualitária e sustentável?

Mesmo que as ideias do Green New Deal, em seu início, não tenham sido pensadas para um contexto de pandemia, acredito que as propostas seguem muito relevantes.

Temos quatro pilares essenciais no Green New Deal, pelo menos no contexto americano. O primeiro deles trata investimento massivo do governo federal no setor público, ou seja, intervenção pública na economia, com o objetivo de reduzir drasticamente as emissões de carbono, chegando a zero emissões no setor de energia em 2030-2035. Isso é essencial para prevenir os impactos extremos da mudança climática.

O segundo pilar seriam os serviços públicos e gratuitos para todos. Nesse sentido o Brasil já está um pouco mais avançado que os Estados Unidos, aqui não temos nem algo que se assemelhe ao Sistema Único de Saúde (SUS). Mesmo sabendo que o serviço público de saúde brasileiro não é perfeito, ainda resiste no Brasil a ideia da saúde enquanto direito humano. Isso é algo que ainda há de ser conquistado nos Estados Unidos.

O terceiro pilar seria a garantia de emprego, uma ideia que propomos para os Estados Unidos, mas que já existe na Índia. Portanto, a garantia de emprego não é uma ideia que só atenderia o Norte Global, pelo contrário. Isso é uma ideia de extrema importância para os trabalhadores de todo o mundo, sobretudo as pessoas negras e indígenas que hoje se encontram sem muitas chances de conseguir trabalho.

E finalmente o quarto pilar que é, na minha opinião, a ideia mais original da esquerda americana a respeito da justiça climática: trata de um investimento desproporcional em comunidades populares, negras, indígenas e latinas, basicamente onde as lacunas da falta de investimentos são maiores. Serão justamente esses lugares que receberão o maior investimento na economia verde.

Que fique claro, a economia verde não é mais uma via de prosperidade para as elites, ao contrário, ela será o motor do combate à desigualdade, com investimento nos mais pobres. São esses lugares que precisam dos painéis solares, de ônibus elétricos, empregos verdes e etc, são essas comunidades populares que vão construir e se beneficiar com o Green New Deal, ou qualquer outro nome que um acordo climático ganhe no Brasil ou no mundo, ele sempre precisará ser construído pelos de baixo. 

AK/HA

Sobre a necessidade de um Green New Deal global, pensando sobretudo em como os países pobres precisam recorrer ao extrativismo para obter dólares e, assim, se sujeitam a uma economia que gera graves danos socioambientais. Como resolver isso?

DC

A minha perspectiva teórica, que compartilho com as coautoras, é de que o tema do clima e do meio ambiente está lado a lado na luta contra o capitalismo. Para nós a desigualdade racial, a exploração dos trabalhadores, a exploração das mulheres no âmbito doméstico e os danos ambientais não são acidentes infelizes causados por um capitalismo imperfeito. A desigualdade e a exploração são motores do desenvolvimento capitalista em todos os países. A miséria econômica e a miséria ambiental são inseparáveis.

Essa dinâmica pode ser vista entre os países e dentro dos países. Nos parece óbvio que a exploração dos recursos naturais se dá muito mais nos países periféricos, mas acontece também nos países desenvolvidos, como na questão do carvão na Inglaterra por exemplo, desenvolvimento desigual acontece no âmbito local, mas é mais forte ainda entre os países.

No Brasil é fácil enxergar essa grande desigualdade. Por exemplo, é só lembrar da famosa foto que retrata de um lado um edifício no Morumbi, com piscinas em cada uma das sacadas de seus apartamentos, mas do outro lado está a favela de Paraisópolis. Para combater essas desigualdades é necessária uma luta global e de profundas alianças entre os movimentos de trabalhadores, movimentos de sem terra, movimentos negros de cada país. 

Talvez uma das questões mais relevantes da economia verde ou quando falamos de energias renováveis, se trata de que para construir a quantidade de painéis solares e de turbinas eólicas necessárias, é preciso muita mineração, então será preciso discutir quais são as condições em que vai se dar essa mineração. Acredito que não seja um acidente o que está acontecendo no Sul Global: a mineração do Lítio no Chile não se parece em nada com a mineração do Lítio na Austrália, elas são bem diferentes.

O que defendemos em Um planeta a conquistar, como ponto essencial, é que a descarbonização do Norte não tenha como custo a destruição de comunidades no Sul Global. Precisaremos de uma forte unidade entre os trabalhadores do Sul e do Norte, para alcançarmos um nível igual de desenvolvimento de uma nova economia verde. Precisamos de uma visão ecossocialista, e não se pode construir o ecossocialismo em um país só, nem em uma única cidade.

Muitas vezes, quando discutimos o tema da mudança climática, o internacionalismo parece se restringir às conversas nas Nações Unidas. Mas se formos observar atentamente o tema do clima, vamos perceber que o mais relevante não são as discussões promovidas pelas Nações Unidas ou pelo Fórum Econômico Mundial sobre mudança climática, mas ao contrário, o mais importante são as relações e acordos de intercâmbio internacional. Queremos uma economia política para a mudança climática, cooperação entre comunidades e uma luta por um intercâmbio de recursos justo, não queremos apenas tratar de acordos climáticos, porque a lei internacional verde pode ter nenhuma relevância em uma mudança real. 

AK/HA

O título de um planeta a conquistar faz referência direta à frase final do Manifesto Comunista. Um grande trabalhadores do mundo, uni-vos…pelo meio-ambiente junto de justiça social e prosperidade econômica. Então, nos conte sobre essa inspiração.

DC

Bem observado. O título foi uma escolha do editor, mas tem tudo nele tem a ver com o Manifesto, gostamos muito da referência. Em português, ele ficou muito bonito, porque remete às conquistas dos trabalhadores.

O Manifesto Comunista é um livro essencial para o ecossocialismo, Marx já no séc. XIX aponta como a burguesia industrial vinha modificando totalmente a natureza. Quando ele diz que o capitalista está construindo maravilhas, coisas tão grandes que fazem as pirâmides parecerem pequenas, podemos pensar na transformação da natureza. Precisamos entender que o capitalismo tem a capacidade de mudar fisicamente o mundo de uma maneira que nenhum outro sistema já teve.

A emergência climática  é a história do colonialismo e do capitalismo.

AK/HA

Diversos megacrimes ambientais aconteceram nos últimos anos no Brasil, alguns ligados a grandes corporações ou a pequenos proprietários de terra. O rompimento das barragens de Mariana e Brumadinho, que mataram centenas de pessoas diretamente e ainda geraram danos duradouros, mas também um misterioso vazamento de petróleo no litoral nordestino ou os incêndios gigantes na Amazônia e no Pantanal. Como você avalia essa emergência?

DC

Primeiro, a política ambiental não pode trazer só objetivos distantes no tempo e na geografia. É sem sombra de dúvidas muito importante salvar a Amazônia e parar imediatamente com o desmatamento, mas o trabalhador que mora em uma comunidade da Zona Sul de São Paulo deveria pensar se o ônibus que o leva ao trabalho chega a cada dez minutos e é elétrico, se ele tem um bom emprego, se a sua comunidade tem painel solar que garanta energia, se em caso de um deslizamento de terra sua casa estará segura etc.

Se essa mudança ocorresse em um curto período, aí sim poderíamos chamar de uma política ambiental exitosa. Se ao contrário, a política ambiental se resumir a ter a sua comida com uma etiqueta orgânica, reduzir emissões e o desmatamento os efeitos só poderão ser vistos em um longo intervalo de tempo. Mas a ideia do Green New Deal é levar os resultados das políticas ambientais para a casa dos trabalhadores.

Com relação aos crimes, antigamente se dizia que existia uma contradição entre desenvolvimento econômico e proteção do meio ambiente, mas como estamos vendo, esses crimes e desastres não são em nome do progresso ou desenvolvimento humano.

O que o conjunto dos trabalhadores ou da humanidade ganha com esses crimes? Quando assistimos a destruição da Amazônia e do cerrado brasileiro para aumentar as vendas de corte de carne suína para a China, isso não é feito em nome de uma melhora na vida econômica dos brasileiros. O desmatamento da Amazônia faz o ruralista lucrar cada vez mais, mas não melhora a vida do trabalhador — o inverso do que víamos durante o governo Lula, em que o desmatamento diminuía e a qualidade de vida melhorava.

Esses crimes tornam mais fácil de explicar que a destruição do meio ambiente, e até do planeta, não vale a pena, pois quem se beneficia são sempre os mais ricos e nenhum progresso para os trabalhadores comuns é alcançado.

Para o povo é muito mais interessante um emprego verde e serviços públicos de qualidade, baixo tempo de deslocamento e acesso às coisas boas da vida. Pensar que qualquer pessoa possa ir para a praia de carro ou ônibus elétrico quando quiser, com carga horária reduzida, ar limpo, isso é possível, mas não se seguirmos a lógica do mercado. 

AK/HA

Em tempos de pandemia, como pensar a questão da saúde?

DC

Se acreditamos na garantia de emprego, é certo que acreditamos ser preciso pagar as pessoas para ficarem em casa durante a pandemia. Isso foi um grande problema nos Estados Unidos, o trabalhador não podia trabalhar e não recebia salário — e, por conta disso, tivemos um forte movimento de trabalhadores durante o governo Trump em torno dessa pauta.

Outro grande tema em relação à pandemia é a privatização do conhecimento. Por que tantas vacinas são privadas? Por que não estão todos produzindo a mesma vacina? Tivemos o exemplo da luta brasileira pela distribuição de medicamentos para HIV, por analogia isso deveria ser a regra para qualquer pandemia. A primeira empresa que encontra o método de produzir a vacina, deveria compartilhar com o restante da humanidade.

A mesma coisa para economia verde, os países ricos, que têm as melhores universidades, ao descobrirem uma nova tecnologia deveriam compartilhar com os países do Sul Global. Não faz sentido que a tecnologia e o conhecimento que podem salvar vidas, seja com energia renovável ou na medicina, sejam privados. Conhecimento pertence ao mundo inteiro.

No livro falamos muito sobre os empregos verdes. Normalmente, vem à nossa mente  homens que trabalham na construção civil ou nas usinas de energia renovável. Mas os tempos de pandemia nos mostraram a importância das mulheres que trabalham no setor de cuidados, como na enfermagem ou na educação, que no caso dos Estados Unidos são na sua maioria de mulheres negras e latinas — que são as militantes mais aguerridas no movimento sindical e já estão realizando um trabalho de baixo carbono, que deveria ser o objetivo da humanidade.

Eu já vi enfermeiras em São Paulo lutando pela redução de jornada. Já há estudos provando que quando se reduz jornada de trabalho, se está reduzindo as cargas de carbono. Na Europa se observou um movimento de redução de jornada acompanhada com a redução do consumo. As pessoas tendem a consumir menos e gastar o seu tempo livre com atividades culturais, educacionais ou de lazer. É uma luta dos trabalhadores desde o início de sua história. Nunca interessou à classe trabalhadora o crescimento do PIB, mas sim o bem viver, precisamos encontrar qual é essa forma de bem-estar sem destruir o meio ambiente.

A visão de bem viver que o Green New Deal apresenta é exatamente a visão que temos para a saúde e para a pandemia. A Infraestrutura de cuidado é extremamente importante, e não está recebendo a devida importância. Para os ricos sim, mas como um bem social ainda não.

AK/HA

Como você avalia os impactos do governo Trump no meio-ambiente e, em contraste, o início da presidência de Biden? Como está a conjuntura interna do governo americano e a disputa dentro dele sobre o Green New Deal?

DC

Sobre os Estados Unidos, a situação é complicada, tivemos com Joe Biden, que venceu as eleições, uma forte promessa de investimentos verdes. A sua plataforma de campanha tinha quatro pilares, sendo um deles os investimentos no setor verde. Biden defendeu que a retomada da economia no pós pandemia deveria ser feita com investimento verde.

Biden incorporou essa pauta e aceitou metas de descarbonização bastante agressivas graças à pressão de Bernie Sanders, Alexandria Ocasio-Cortez e dos movimentos de esquerda. Mas não podemos ter ilusões. O programa de Biden não é o programa da esquerda. Biden representa o programa do Capitalismo Verde.

Os americanos e os brasileiros são os últimos a aprender que o capital mundial já mudou para o setor verde. Se formos acompanhar as discussões em Davos, no que está escrito no Financial Times, todos estão caminhando para um consenso do capital verde. 

Biden está apenas seguindo essa onda do capitalismo global. Mas haverá sem dúvidas uma grande luta para definir os rumos desses investimentos verdes. Para a esquerda, acredito que é favorável acompanhar um setor moderno da burguesia, foi assim com a classe trabalhadora industrial do século passado lutando contra a burguesia e os setores mais atrasados, vimos isso com o Lula buscando os setores mais modernos da agroindústria e da indústria urbana.

Portanto, devemos tentar responder a pergunta de quais seriam os setores aliados no capital em um curto período de tempo. A gente precisa acabar com o capitalismo, mas isso não se dará amanhã, então precisamos encontrar as lacunas onde os trabalhadores possam ter hegemonia em uma aliança com os setores progressistas da classe média. Que seja capaz de unificar negros, mulheres, latinos e a classe média em torno da ideia de economia verde e que possa confrontar as ideias de capitalismo verde de empresas como a General Motors por exemplo.

Os Estados Unidos chegaram na década de 2020, que é o mundo do capitalismo verde deixa para a esquerda a grande tarefa de lutar e ir para além do capitalismo verde, mesmo reconhecendo que o capitalismo vá nessa direção, sem julgamentos morais, ser verde não é necessariamente bom, nem mal.

O problema de não fazermos a disputa é que poderemos nos defrontar com espécies de ecoapartheids ou ecofascismo, que seriam soluções ótimas para as elites globais e muito dolorosas para a classe trabalhadora. No fim das contas os ricos poderiam, depois de reprimir os salários, reprimir facilmente até o consumo do trabalhador.

Nesse contexto, Lula poderia ser um excelente mensageiro de um acordo ambiental, ele me parece ser uma das vozes capazes de convencer os trabalhadores e o conjunto da sociedade da imensa tarefa de combater as desigualdades e salvar o planeta em que vivemos.

Sobre os autores

é professor assistente de sociologia da Universidade da Pensilvânia, onde dirige a Socio-Spatial Climate Collaborative. É um dos autores do livro "A Planet to Win: Why We Need a Green New Deal", que será publicado em 2020 pela Autonomia Literária.

é diretora editorial de Jacobin Brasil.

é publisher da Jacobin Brasil, editor da Autonomia Literária, mestre em direito pela PUC-SP, advogado e diretor do Instituto Humanidade, Direitos e Democracia (IHUDD).

Cierre

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Published in América do Norte, América do Sul, Antifascismo, Capital, Ecologia, Entrevista and Política

3 Comments

  1. […] Gostaríamos de parabenizá-la pela tua fala de abertura na COP 26 (Conferência das Partes). Foi uma coisa espetacular, teve uma força enorme. Um discurso forte, que elenca o papel dos povos indígenas na linha de frente da emergência climática. […]

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