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Vivi Reis, que começou sua militância política na luta contra a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, discursa na Assembleia Mundial pela Amazônia, na Cúpula dos Povos, em Glasgow, na Escócia. Foto Midia Ninja.

Floresta não é mercadoria

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Conversamos com a deputada federal Vivi Reis, do PSOL, que está na COP26 para revelar ao mundo como o desenvolvimento do agronegócio e o "capitalismo verde" estão devastando nossas florestas.

UMA ENTREVISTA DE

Claudia Horn

Durante a COP26, os olhos do mundo todo se voltaram para as questões climáticas. Empresários e políticos disputaram os holofotes de quem traria melhores soluções para o desenvolvimento de um capitalismo verde. 

Claudia Horn, colaboradora da Jacobin Brasil, conversou com uma das vozes de resistência e dissonância que esteve presente em Glasgow entre centenas de militantes do mundo todo. Vivi Reis tem 30 anos e é deputada federal pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) no Pará, um Estado marcado profundamente pelas feridas do agronegócio e da devastação travestida de progresso. 


CH

Qual é a sua agenda principal aqui em Glasgow? E como você pretende protestar contra a política climática no âmbito federal e estadual do Pará? 

VR

Antes de mais nada é importante dizer que estou aqui em Glasgow representando o PSOL como um todo, mas principalmente a nossa bancada do Pará. Viemos para acompanhar as movimentações e as negociações da COP26 e estreitar relações a nível internacional com os movimentos sociais e com outras autoridades que estejam comprometidas de fato com a pauta ambiental e o combate à mudança climática.

Acredito que nossa agenda aqui não deve ser puramente institucional, não temos ilusões de que a COP26 vá alcançar de maneira efetiva os objetivos que nós esperamos e o que estamos buscando para os nossos territórios. 

Por isso, mesmo temos que aproveitar ao máximo o espaço para construir essas articulações internacionais, para colocar em foco a pauta da Amazônia, dos povos tradicionais, a defesa dos direitos humanos e a nossa perspectiva para compreender o meio ambiente.

Além de participar e somar nas mobilizações e nos atos de rua que vão para além das mesas formais, queremos criar uma rede de articulações com a juventude, com as mulheres e com os povos tradicionais do mundo todo. 

CH

Neste ano, o chamado mercado de carbono está em pauta, um mecanismo para países e empresas cumprirem com as metas de emissões comprando créditos de carbono de outros países ou realizando projetos de reflorestamento ou conservação em vez de diminuir suas emissões. É, sem sombra de dúvidas, um assunto bem importante para a floresta. Qual é a sua visão no assunto?

VR

É interessante analisarmos como isso é parte de um projeto de mercantilização da pauta climática. É preciso dizer que essa proposta, que estará em pauta na câmara de deputados na próxima semana, reafirma um processo desigual em que os países subdesenvolvidos e mais pobres vão ficar em desvantagem. O Brasil está no centro de tudo isso, estamos assistindo o aumento da lógica de privatização da própria floresta.

Nossa preocupação no PSOL é entender como isso vai repercutir diretamente sobre os territórios. Há um apelo crescente para aprovação dessa pauta, neste momento em que estamos na COP26 e que os olhos estão voltados para essas discussões, parece haver um sentimento crescente na base do governo de querer aprovar na câmara projetos relacionados com a questão climática às pressas para tentar mostrar serviço.

E sabemos que a agenda climática desses deputados resulta em aprovações de leis que legalizam o garimpo ou prejudicam a luta pela demarcação de terras indígenas, como o PL 490 que já foi aprovado na CCJ, entre outras dezenas de projetos que vão diretamente contra a nossa perspectiva na questão ambiental. 

Essa tentativa de mostrar serviço apresenta um trabalho muito incompleto, porque não tem efetividade na perspectiva do que os representantes do território entendem enquanto necessidades climáticas e ambientais. Acredito que o debate precisa ser reavaliado como um todo.

Hoje o PSOL é o único partido que se posiciona explicitamente contra esse projeto, justamente por entender que florestas e o meio ambiente não podem ser mercantilizados. Sabemos que vamos sofrer diversas críticas, sabemos que não é uma posição simples de se defender. Principalmente porque existem muitos setores que poderiam ser aliados sendo cooptados para essa lógica mercantilista. 

Nosso papel é seguir firmes com uma política que combata essa lógica ambiental capitalista e é justamente esse o espaço de disputa que queremos ocupar aqui na COP26, essencialmente apresentando as debilidades e as contradições do capitalismo verde. 

CH

A COP26 também está ainda mais desigual, a participação da sociedade civil esse ano ficou ainda mais restrita por conta da pandemia, então é muito bom que você esteja aqui. Quais são as questões mais importantes para os seus eleitores no Pará e quais são as principais lutas hoje no seu Estado?

VR

Eu iniciei a minha militância política na luta contra a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, que foi um empreendimento gigantesco que causou imenso sofrimento a diversos povos indígenas. Hoje a nossa bancada no Pará segue concentrada em alertar sobre os perigos da política do governador Helder Barbalho do MDB, que segue expandindo grandes empreendimentos no Estado, como ferrovias e rodovias voltadas a atender exclusivamente o agronegócio. Com o limitante de termos, nossas vozes ignoradas ao não realizarem nenhuma consulta prévia. 

Nós não somos contra investimentos, mas eles precisam estar diretamente conectados com as necessidades da população, com a possibilidade de fiscalização da sociedade. Porque o que assistimos hoje são investimentos na destruição de nossos territórios e de priorizar o garimpo, as madeireiras e o agronegócio como um todo. 

O próprio ex-ministro do meio ambiente Ricardo Salles visitou continuamente o Pará durante a sua gestão, justamente para facilitar as negociações com as madeireiras, a grilagem de terras, a pulverização de agrotóxico que são os problemas que atingem várias comunidades, inclusive alguns assentamentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) que são atingidos diretamente pelos agrotóxicos.

Para destacar uma das muitas lutas que estamos travando podemos falar sobre a construção da Ferrogrão, uma rodovia que vai cortar o estado e ligar o Pará à Cuiabá. As obras da ferrovia já estavam sendo iniciadas e já havia uma grande articulação para a sua construção quando nós do PSOL conseguimos barrar as obras através de uma representação no STF, mesmo sendo minorias na bancada do Pará que em sua maioria está interessada em acelerar as obras. 

Eles têm pressa porque isso beneficia diretamente o agronegócio, mas vai passar por dentro de territórios indígenas, quilombolas e pode ser uma verdadeira devastação. Por isso trouxemos essa luta até aqui, para fazer um apelo internacional de que essa decisão do STF precisa se manter, caso contrário será uma tragédia incalculável para a biodiversidade, a cultura e a vida naquela região e só trará benefícios aos empresários.

As nossas pautas são ligadas diretamente com as demandas dos povos indígenas, ribeirinhos, quilombolas, a população do campo que são os principais alvos dessa política que é vendida como desenvolvimento, mas que na verdade é uma devastação completa.

Sobre os autores

é militante socialista e deputado federal do Pará pelo PSOL.

é uma socióloga morando em Belém e terminando sua tese de doutorado na London School of Economics sobre justiça climática e iniciativas internacionais para a conservação da Amazônia.

Cierre

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Published in América do Sul, Ecologia, Entrevista, FORMATO and Meio Ambiente

One Comment

  1. […] por uma crescente da extrema direita, uma ofensiva desse sistema capitalista que só vê a floresta como lucro – e que passa acima da vida, principalmente daqueles que vivem a vida de uma forma diferente. […]

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