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Ex-presidente Lula lendo a primeira edição da Jacobin Brasil.

Lula no primeiro turno

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O eleitorado está espontaneamente antecipando o 2 turno. A última pesquisa do IPEC e Datafolha confirmam: a um dia da eleição, Lula marca 51% e 50% e Bolsonaro 36% e 37%. Vamos eleger o operário retirante que teve o arrojo, beirando a provação, de se declarar um “socialista sofisticado” no meio do programa do Ratinho.

Uma vitória do Lula já no primeiro turno nunca pareceu o cenário mais provável. E, no entanto, as pesquisas mais confiáveis apontam hoje como uma possibilidade palpável, ainda que longe de certa. É uma chance boa demais para ser desperdiçada.

A última pesquisa do IPEC e Datafolha confirmam: a um dia da eleição, Lula marca 51% e 50% e Bolsonaro 36% e 37%. Nenhum outro candidato chega nem perto. Lula lidera folgadamente, com tendência de alta: tem mais intenções de votos que todos os demais somados. É mais ou menos o mesmo resultado obtido quando se agrega as pesquisas IPEC de todos os estados, conferindo ainda mais solidez ao resultado. O agregador de pesquisas do Estadão, que utiliza os resultados de 14 institutos diferentes, já dá 52% dos votos válidos para Lula. O que indica que se as eleições fossem agora, Bolsonaro poderia já ser derrotado logo no primeiro turno.

“A terceira via naufragou, seja o primeiro plano das classes dominantes de reinventar uma direita liberal não-bolsonarista, seja a tentativa cirista (frustrada por falta de apoio nas classes fundamentais).”

A razão pela qual hoje essa é uma possibilidade concreta, é que o pleito ganhou ares plebiscitários. Com dois candidatos que já exerceram a presidência, cada um contando com uma base social sólida, na prática não houve espaço viável para nenhuma alternativa. O eleitorado está espontaneamente antecipando o segundo turno. A terceira via naufragou, seja o primeiro plano das classes dominantes de reinventar uma direita liberal não-bolsonarista, seja a tentativa cirista (frustrada por falta de apoio nas classes fundamentais) de furar a polarização resgatando o discurso do nacionalismo desenvolvimentista. Sobraram Bolsonaro, líder inconteste do campo da direita, e Lula, a principal liderança popular do último ciclo político. Nessa quadra, a escolha só pode ser uma: Lula no primeiro turno.

A antecipação do segundo turno é um fato

Esses são os fatos: se houver segundo turno, será entre Bolsonaro e Lula, que estão não só isolados na disputa, mas com uma alta consolidação de voto – 90% de seus eleitores dizem que já estão totalmente decididos. 

“Agora, cada voto que não for em Lula é, objetivamente, um voto em favor de um segundo turno – com Bolsonaro nele.”

Uma campanha eleitoral pode servir a distintos propósitos, e até aqui candidaturas presidenciais que não são eleitoralmente viáveis puderam cumprir missões justas. Quem queria jogar ideias no debate público, jogou; quem queria se auto-construir, se auto-construiu. Mas a política seguiu sua lógica, e o cenário está desenhado – independente de gostarmos dele ou não. Agora, cada voto que não for em Lula é, objetivamente, um voto em favor de um segundo turno – com Bolsonaro nele.

E há boas razões para não querer um segundo turno. A maior delas talvez seja: quem em sã consciência desejaria dar mais um mês para Bolsonaro fazer campanha? Francamente, não estamos todos exausto desse genocida? Não seria melhor enxotá-lo de uma vez? 

É verdade que ele manterá o palanque presidencial até o fim do ano, o que não é pouca coisa, e por si só suficientemente perigoso. Mas queremos mesmo ver mais um mês de comícios e motociatas? De possibilidade de aglutinação reacionária e mais oportunidade para propaganda fascista? Mais tempo de TV no horário eleitoral gratuito? Mais chance para a extrema direita tentar cavar um fato novo ou buscar novas formas de tumultuar o processo? Santa paciência. Estamos fartos.

Liquidar a fatura agora é mais rápido, mais seguro, e, sobretudo, mais gostoso. Pense na cara de desespero e incredulidade da família Bolsonaro que o jogo (pelo menos o democrático) acabou, e eles estão fora. Serão lágrimas deliciosas de saborear – o quanto antes, melhor.

Por que a burguesia quer o segundo turno

Para nós, socialistas, há razões adicionais para liquidar logo a fatura. Lula é uma liderança social forjada nas lutas de massas e sustentada pela força do movimento popular (quem, afinal, ficou para dar “bom dia, presidente Lula” em Curitiba quando todos os empresários lhe viraram as costas?). 

“Vencendo agora, Lula estará mais legitimado para derrubar o teto de gastos, aumentar o salário mínimo, revogar a reforma trabalhista, realizar a demarcação das terras indígenas.”

Para derrotar o bolsonarismo, Lula conformou em torno de si uma amplíssima aliança, que inclui setores da centro direita e parcelas da burguesia brasileira: é o cabeça de uma frente democrática que vai muito além da esquerda. No entanto, Lula conseguiu aglutinar esse apoio democrático sustentando um discurso fundamentalmente social, que coloca a ênfase no emprego, no salário, na educação e nas necessidades materiais da maioria trabalhadora. Uma vitória logo no primeiro turno reforça um mandato com as principais ideias associadas à esquerda: o combate à desigualdade e à pobreza, a soberania nacional e popular. 

Vencendo agora, Lula estará mais legitimado para derrubar o teto de gastos, aumentar o salário mínimo, revogar a reforma trabalhista, realizar a demarcação das terras indígenas e promover um programa de investimentos públicos que crie empregos de qualidade e simultaneamente acelere a transição ecológica

Essa é a principal razão pela qual a classe dominante aposta no segundo turno: para tentar arrancar mais concessões, forçar o governo Lula a ser mais conciliatório e recuado. Não nos enganemos, essa disputa não acaba nas eleições, e se dará prioritariamente nas ruas e nos lugares de trabalho. Lula estará, desde o primeiro dia, sob intensa pressão, incluindo de parte significativa de seus aliados, para fazer o mínimo possível, e aceitar os retrocessos do bolsonarismo como fato consumado. 

Os movimentos sociais terão que saber como estar mobilizados em nome de uma agenda concreta, para permitir que Lula faça mesmo aquilo que hoje ele diz querer fazer. Será necessário mostrar que há uma demanda real na sociedade para mudanças mais profundas em um sentido democratizante. É a partir desse processo de mobilização que uma nova recomposição política poderá emergir. Ganhar no primeiro turno é o primeiro passo para gerar uma onda democrática que continuará em movimento após as eleições.

A derrota e desmoralização do bolsonarismo é para nós, socialistas, uma imensa oportunidade. Perder logo no primeiro turno é uma baita desmoralização – que pode, e deve, ser simbolizada por nós como um rechaço popular massivo à direita, às suas ideias e valores. É impedi-lo de conquistar mais um voto sequer, e impor ao seu clã a humilhação histórica de não chegar ao segundo turno mesmo já ocupando a cadeira presidencial. É um choque que pode funcionar como uma quebra de feitiço capaz de acordar muitos do transe bolsonarista. E, para adicionar insulto à injúria, por um operário retirante que teve o arrojo, beirando a provação, de se declarar um “socialista sofisticado” em pleno programa do Ratinho.

Se você odeia Bolsonaro, vai adorar o socialismo

Recentemente escrevemos que Bolsonaro tem toda razão em não gostar de nós, os socialistas. O que para nós, não deveria ser nada além de motivo de orgulho: “Afinal, somos precisamente o contrário de tudo o que ele representa, e queremos de fato derrubá-lo. Aliás, não só ele, como também as condições que o tornaram possível: queremos ir à raiz, para dar conta, lá embaixo, dos problemas e impasses profundos dos quais o próprio Bolsonaro é apenas um sintoma particularmente mórbido.”

Esse domingo, portanto, devemos ir às urnas confiantes, atentos e de prontidão. Se elegermos Lula no primeiro turno, nossos inimigos, que não estarão extintos, poderão sentir a força do vento que os fará recuar. A tarefa socialista é a de amargar a segunda feira da família Bolsonaro, e arrancar alegria ao futuro de toda a nossa gente.

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Published in América do Sul, Análise and Política

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