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SAN FRANCISCO - 1999: Progressive author Michael Parenti poses for a portrait in 1999 in San Francisco, California. (Photo by Herb Snitzer/Michael Ochs Archive/Getty Images)

Se você quer entender a atualidade do fascismo, leia Michael Parenti

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Ao contrário do que pensa o senso comum, o fascismo não é uma mistura de sentimentos irracionais nutridos por ignorância ou convicção religiosa, mas uma ideologia impulsionada por contrarrevoluções com uma visão estratégica que atende a interesses bem concretos, racionais e objetivos na luta de classes. É o que mostra o célebre livro de Michael Parenti finalmente lançado no Brasil.

Extraído do livro Os camisas negras e a esquerda radical: fascismo racional e a derrubada do comunismo, de Michael Parenti (Autonomia Literária, 2021).


O Brasil vive um divisor de águas na sua história, com Luis Inácio Lula da Silva de um lado e Jair Bolsonaro do outro. O ex-presidente é uma figura fascista liderando uma contrarrevolução preventiva que, caso não seja derrotada – não mais só nas urnas mas politicamente no médio e longo prazo nas ruas –, vai provocar um nível de regressão civilizacional só comparável com a tragédia da Rússia após a derrubada da União Soviética.

Infelizmente, o resultado das urnas não irá limpar o Brasil do fascismo. Embora seja fundamental nos rumos do país, o processo eleitoral mostrou apenas se o fascismo nacional ficaria mais forte ou mais fraco institucionalmente. Em todo caso, teremos que continuar lutando nos próximos anos contra forças político-sociais fascistas.

Nesse sentido, o antifascismo não pode ser um mero slogan ou tática eleitoral. O antifascismo deve ser parte orgânica de qualquer estratégia política realmente popular com vistas ao fortalecimento de projetos de esquerda ou socialistas. Essa conclusão levanta a seguinte pergunta: o que é antifascismo e qual antifascismo defendemos?

A racionalidade do fascismo

O livro Os camisas negras e a esquerda radical: fascismo racional e a derrubada do comunismo, escrito por um dos principais pensadores marxistas dos EUA, Michael Parenti, ajuda nessa resposta. Antes de tudo, Parenti não pensa o fascismo como um ajuntamento de sentimentos, posturas e pautas irracionais nutridas por mera ignorância ou pela força da religião – leitura bem comum em vários segmentos da esquerda brasileira sobre o que é o bolsonarismo.

Já no primeiro capítulo do livro, “Fascismo Racional”, o autor faz um debate materialista e concreto sobre o que significa o fascismo na história do capitalismo e da luta de classes.

“O autor facilita a compreensão dos limites da perspectiva liberal de enfrentamento ao fascismo e mostra que a negação da besta fascista não é a democracia liberal burguesa, mas sim o poder popular.”

O fascismo traz consigo, sem dúvidas, vários elementos de irracionalismo e misticismo. Contudo, em visão panorâmica e estratégica, a emergência desses movimentos de extrema direita atende a interesses bem concretos, racionais e objetivos. É fundamental ter essa compreensão para pensarmos como o bolsonarismo tomou forma e como pode ser destruído.

Qual antifascismo?

Do segundo ao quinto capítulo do livro, o autor nos ajuda a pensar qual antifascismo pode ter a força necessária para derrotar fenômenos como o bolsonarismo. É comum, frente à extrema direita, apelar para frentes amplas liberais, centristas e discursos moderados. O autor facilita a compreensão dos limites da perspectiva liberal de enfrentamento ao fascismo e mostra que a negação da besta fascista não é a democracia liberal burguesa, mas sim o poder popular.

Parenti tem coragem para colocar em reflexão o anticomunismo de esquerda, mostrando como, em vários momentos e em nome de uma falsa criticidade e por um “socialismo democrático”, diversos setores da esquerda atuaram como linha auxiliar do imperialismo, ajudando as forças reacionárias e de extrema direita a se fortaleceram.

“O autor ajuda a compreender como a contrarrevolução neoliberal e neocolonial que varreu o mundo nos últimos anos tem íntima relação com o fortalecimento da extrema direita e do fascismo.”

No Brasil, dada a tradição política que lidera a esquerda nacional nos últimos 30 anos, o anticomunismo de esquerda é amplo, e um impeditivo a um confronto ideológico vitorioso contra os discursos delirantes do bolsonarismo e do campo liberal – como a comparação de Hugo Chávez com Bolsonaro, aceita por largos setores da esquerda nacional.

Contrarrevolução neoliberal

Nos demais capítulos do livro, o autor ajuda a compreender como a contrarrevolução neoliberal e neocolonial que varreu o mundo nos últimos anos – como na antiga União Soviética e no Leste Europeu – tem íntima relação com o fortalecimento da extrema direita e do fascismo. O neofascismo do século XXI pode ser pensado, dentre outras coisas, como uma radicalização da política burguesa sem um contraponto proletário e radical.

No Brasil, por exemplo, o bolsonarismo foi extremamente útil para avançar pautas ultraliberais de destruição de direitos históricos e da soberania nacional – como a “autonomia” do Banco Central, a destruição sistemática da Petrobras e outras estatais. Sem nenhum medo do avanço da classe trabalhadora, a classe dominante do país pôde abraçar um sujeito desprezível como Paulo Guedes sem precisar temer uma revolta popular generalizada.

“Michael Parenti um dos mais geniais pensadores da história do marxismo e o maior representante vivo do pensamento crítico estadunidense.”

Chamo atenção para o fato de que esse é um livro muito erudito, qualificado e rico. Seria impossível resumir toda a qualidade desta obra em poucas linhas. É um livro que fala muito sobre o Brasil de hoje e nossos desafios e que pode e deve ser encarado como uma arma na construção do futuro.

Para concluir, preciso deixar uma consideração sobre o autor. Considero Michael Parenti um dos mais geniais pensadores da história do marxismo e o maior representante vivo do pensamento crítico estadunidense. Parenti, infelizmente, é pouco conhecido no Brasil. Mas isso começa a mudar. Várias editoras, acadêmicos e militantes começaram a descobrir a criatividade, inovação e ousadia inscritas na obra de Parenti. O autor, embora bastante doente e debilitado, segue vivo e pode acompanhar o público brasileiro descobrindo sua obra. Leiam tudo que puderem de Michael Parenti. Garanto que não vão se arrepender.

Sobre os autores

é mestre em serviço social pela UFPE, organiza livros pela editora Autonomia Literária, mantém um canal no YouTube e participa do podcast Revolushow.

Cierre

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Published in Análise, Europa, História, Livros and Política

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