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Não haverá paz com Bolsonaro livre para continuar cometendo crimes e liderando sua quadrilha. Foto de Marcos Correa.

Não basta punir Bolsonaro eleitoralmente – ele precisa responder criminalmente

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Bolsonaro foi declarado inelegível pela Justiça Eleitoral e tem apenas uma remota chance de reverter essa decisão. Mas não podemos parar por aí: a luta pela responsabilização penal do ex-presidente pelos graves crimes cometidos contra os brasileiros e o patrimônio público precisa acontecer.

Hoje, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu pela inelegibilidade de Jair Messias Bolsonaro, em ação que lhe foi movida pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT). Pela decisão, ele ficará proibido de disputar eleições por oito anos, a contar a partir de 2022. Ainda cabe recurso da decisão, mas é pouco provável que o Supremo Tribunal Federal (STF) o aceitará. 

Isso se trata de uma vitória do povo e da classe trabalhadora, mas ainda não é o suficiente. Foi o primeiro grande freio da justiça a Bolsonaro, depois que, basicamente, ele podia fazer o que bem entendia nas eleições de 2018 – quando o líder das pesquisas tinha sido preso ilegalmente por seu futuro ministro da Justiça – e durante a presidência. Mas não basta perder a eleição e ficar inelegível, Jair Bolsonaro precisa ser preso – e essas três ações se complementam. 

A derrota eleitoral imposta a Bolsonaro é resultado de uma mobilização política que deve ser constante, até que o bolsonarismo seja derrotado em todos os aspectos objetivos e subjetivos da política brasileira. Ficar inelegível é uma medida eleitoral tardia, cuja consequência se projeta no futuro, para garantir que Bolsonaro não possa se candidatar novamente; mas só a prisão é a consequência necessária para os crimes que Bolsonaro cometeu enquanto presidente. 

Não se trata de “punitivismo de esquerda”

Não é punitivismo, nem desejo de vingança e nem mesmo crença no Judiciário. O direito penal não é instrumento para Justiça e nem para a pacificação social. Bolsonaro preso não vai trazer de volta nenhuma vítima da gestão genocida da pandemia; não vai trazer de volta nenhum ianomâmi; não vai restituir aos cofres públicos os recursos dilapidados, ao longo de anos, pela família Bolsonaro; não vai restituir os biomas destruídos; nem vai eliminar todos os riscos à democracia brasileira. Sequer vai garantir um pouco mais de saúde mental para quem foi submetido por anos a sofrimento psicológico das barbaridades que o ex-capitão proferia diariamente. 

“Não cabe à classe trabalhadora pacificar o fratricídio da classe dominantes, a não ser que a paz nos interesse. Não haverá paz com Bolsonaro livre para continuar cometendo crimes e liderando sua quadrilha.”

Quem critica que os processos penais contra Bolsonaro são políticos, baseia-se em um legalismo abstrato, defende um garantismo penal de conveniência e desconhece que todos os processos criminais são políticos. Prender milhares de negros e pobres por crimes sem violência é uma política penal. Absolver Bolsonaro ou condenar e não prendê-lo por seus crimes por acaso seria algo apenas técnico? Certamente não. 

Não defendemos algo parecido com a Lava Jato, que fez uso de conspiração para prender sem provas e tirar do jogo político um inocente, feito o Lula. O caso é diferente: exigir que o direito posto seja cumprido, e um criminoso como o Bolsonaro, com inúmeras provas contra si, seja preso. 

Escolhas a fazer

A escolha política em questão é: cumprir ou não o direito posto. Não devemos temer as contradições. O direito penal não serve aos interesses da classe trabalhadora, e ele deverá ser preso pelo mesmo sistema legal burguês cujas injustiças combatemos. Por que defender essa medida? Por que as contradições internas da burguesia, que coloca em prática suas diferentes forças políticas, não podem ser operadas a nosso favor? 

Não cabe à classe trabalhadora pacificar o fratricídio da classe dominantes, a não ser que a paz nos interesse. Não haverá paz com Bolsonaro livre para continuar cometendo crimes e liderando sua quadrilha. É certo que o direito penal não ressocializa e nem constrói, servindo apenas à subjugação e destruição social do sujeito. Não somos defensores do Bolsonaro, e não nos cabe defender mudanças neste sistema, justamente, quando se trata do caso dele. 

“Reconhecer que houve um genocídio contra os ianomâmis é essencial para impedir que novos genocídios aconteçam contra povos indígenas.”

Particularmente importante é a questão do reconhecimento do genocídio: reconhecer que houve um genocídio contra os ianomâmis é essencial para impedir que novos genocídios aconteçam contra povos indígenas. Se não houver o reconhecimento disso, como impedir que no futuro um presidente pratique as mesmas ações que favoreceram o genocídio de povos originários? 

E havendo tal reconhecimento, a lei exige que os responsáveis sejam punidos. Não se pode esperar que um tribunal internacional como o de Haia julgue aquilo que nossas instituições têm competência de julgar.  Bolsonaro precisa ser preso por Genocídio, para que a morte dos ianomamis não fique impune e esquecida; preso como golpista para reequilibrar a democracia brasileira e preso como ladrão para ser desmascarado diante da opinião pública

O bolsonarismo, enquanto ideologia, tem outras fontes além da pessoa do ex-presidente, como os militares, algumas lideranças religiosas e burgueses ultrarreacionários. Os processos penais contra essas organizações criminosas voltadas à destruição do que nos resta de Estado Democrático de Direito devem continuar, mas não cabe deixar tudo na mão do Judiciário, enquanto apartado do Estado Burguês. 

“Precisamos trazer para o nosso lado aqueles da classe trabalhadora que foram ludibriados pela propaganda liberal e bolsonarista.”

A mobilização política que derrotou Bolsonaro nas urnas deve continuar, não apenas se limitando a pressionar por punições. Precisamos trazer para o nosso lado aqueles da classe trabalhadora que foram ludibriados pela propaganda liberal e bolsonarista. Aqueles que tiveram como consolo à fome e ao desemprego o moralismo lavajatista e o conservadorismo hipócrita. Nem a deusa grega Diké (justiça) poderia cortar todas as cabeças de Hidra com um único golpe de espada. Vencer o bolsonarismo é um trabalho hercúleo e longo, mas necessário.

Sobre os autores

trabalha na Defensoria Publica, militante socialista filiado ao Partido dos Trabalhadores, mestre em direito pela PUC-SP e membro do Instituto Humanidade, Direito e Democracia (IHUDD).

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Published in América do Sul, Análise and Política

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