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O jornalista Breno Altman, diretor editorial do site Opera Mundi. (Keiny Andrade/Folhapress)

Em defesa de Breno Altman

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O uso do judiciário brasileiro para cercear críticas a Israel e ao sionismo é perigoso, mas não chega a ser novidade, uma vez que se insere em um contexto global, afetando inclusive a mídia de Israel. Não podemos nos calar diante disso.

O jornalista, judeu e militante antissionista Breno Altman se tornou, no contexto do atual massacre de palestinos em Gaza e também na Cisjordânia, alvo de uma violenta campanha de perseguição. Na atual crise, Altman, um crítico histórico do sionismo, se converteu automaticamente em uma das vozes mais contundentes contra o que, possivelmente, será lembrado como o maior massacre colonial do início do século XXI.

A campanha contra ele começou com ameaças físicas em grupos de WhatsApp — onde se discutia se era mais eficiente “quebrar seus dentes” ou “arrebentar seus dedos para que não escreva mais” — e, agora, passou para uma bizarra tentativa de censura usando o judiciário.

Compreende-se porque Breno Altman incomoda tanto: judeu oriundo de uma família conhecida de militantes comunistas, ele tem sido um das poucas vozes a tratar os fatos ocorridos após o 7 de outubro com a objetividade devida — em tempos em que toda a crítica a Israel é reduzida a “antissemitismo”.

Enumerando os fatos

Aliás, podemos enumerar pelo menos cinco elementos centrais sobre o contexto de 7 de outubro:

  1. Israel é um projeto colonial europeu e segregador, que há décadas sevicia a população árabe palestina do seu território com limpezas étnicas, expulsão de casas para alocação de colonos, negação de água, proibição de agricultura, prisões e execuções ilegais e negação de cidadania, entre outros crimes.
  2. Esses crimes não são sancionados graças ao apoio incondicional dos Estados Unidos, potência com poder de veto no Conselho de Segurança das ONU. Na prática, Israel age com um “rogue state”, que não se obriga a cumprir nenhuma resolução da ONU desde que, ironicamente, foi criado por esta.
  3. Pelo direito internacional, povos submetidos à colonização têm o direito de resistência armada.
  4. O ato do dia 7, embora lamentável por atingir civis — em parte assassinados pelo próprio Estado de Israel, como se sabe por meio da própria imprensa israelense — não é diferente do que foi observado nos levantes anticoloniais na África do Sul durante o Apartheid, na Argélia ou Vietnã ocupados pela França entre outros exemplos.
  5. O que se viu após o dia 7 será possivelmente lembrado como o maior massacre colonial de civis do século XXI. Uma cidade prisão — status prático de Gaza — foi reduzida a escombros, incluindo hospitais e abrigos.  Com um “saldo” de até agora 6 mil crianças assassinadas e outras tantas mutiladas. Autoridades israelenses falam, às claras, atrocidades como comparar os palestinos a “animais” de forma como há muito não se via em um ambiente formalmente hipócrita como a diplomacia.

“Não em nosso nome”

Breno incomoda por enunciar tais fatos sendo judeu. Recusa-se a amparar sua judeidade na defesa incondicional de um projeto colonial, racista e assassino como o sionismo. Breno segue na trilha do movimento que, no passado, teve como expoentes Freud e Einstein e, hoje, inclui Illan Pappé,  Norman Finkelstein e outros que dizem “não em nosso nome”.

O jornalista brasileiro se insere, ainda, na mesma tradição da brigada Thalmann — grupo de alemães que lutaram ao lado da República espanhola contra o fascismo e, depois, integrando as fileiras do Exército Soviético, combateram o nazismo. São exemplos onde a defesa da humanidade pôde superar filiações meramente étnicas ou religiosas. 

Aliás, o maior apoiador dos crimes de Israel na atualidade não são os judeus da diáspora, mas o fundamentalismo cristão dispensacionalista, que defende abertamente a conversão de todos os judeus ao cristianismo. Ao contrário do que se imagina, sionismo e antissemitismo se retroalimentam.

Israel hoje não é apenas um projeto colonial ou ponte do imperialismo norte-americano no Oriente Médio — embora também o seja. O estado sionista é hoje o maior laboratório de tecnologias de opressão racializada do mundo.

Não apenas palestinos, mas armênios no Azerbaijão, camponeses colombianos, favelados no Brasil entre outros condenados da Terra são “clientes” de técnicas criadas pelo Estado israelense.

A “acusação”

Por sinal, a petição inicial da ação movida pela Confederação Israelita do Brasil (Conib) contra Breno Altman seria risível, não fosse trágica. A acusação se baseia, dentre outras coisas, em um post de Altman no antigo Twitter, na qual ele parafraseou um dito imortalizado na boca do líder chinês Deng Xiaoping nos anos 1960 para, assim, defender a resistência palestina: “Não importa se o gato é preto ou branco desde que cace ratos“.

A frase de Deng se refere a outra paráfrase, desta vez de um dito repetido pelo marechal Liu Bocheng, no contexto cultural da província chinesa de Sichuan; Imaginem a torção interpretativa para transformar um dito sichuanês, acerca do valor do pragmatismo, e referido dentro do movimento comunista chinês em uma afirmação antissemita… ainda por cima por um jornalista, ele mesmo, de origem judaica.

Esse cerceamento esdrúxulo entra em um contexto global de censura, no qual artistas de Hollywood têm perdido emprego por defenderem os palestinos e, até mesmo, um jornal israelense como o Haaretz sofre ameaças de censura por ministros do governo Netanyahu, furiosos com reportagens investigativas demolidoras sobre a atual crise.

Breno incomoda os sionistas brasileiros, ao desmascarar, contundentemente, o caráter racista dos defensores do genocídio palestino. Sua questão é da mais alta gravidade para a liberdade de imprensa — e exige solidariedade concreta.

Contra a censura e contra o sionismo. Todo apoio a Breno Altman.

Sobre os autores

é psicólogo, mestre e doutor em saúde coletiva e conselheiro do CRP05.

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Published in América do Sul, Análise, Imprensa and Política

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