A vitória de Alexandria Ocasio-Cortez nas eleições primárias em junho pegou de surpresa o Partido Democrata e o establishment dos meios de comunicação. Concorrendo pelo décimo quarto distrito de Nova Iorque para o congresso, derrotou com folga um dos políticos mais tradicionais do partido e transformou-se rapidamente numa figura nacional.
No entanto, de repente a questão se tornou “e agora?”
Temos todos os motivos para acreditar que o sucesso da Ocasio-Cortez no décimo quarto distrito de Nova Iorque pode ser replicado. Máquinas eleitorais democratas anteriormente poderosas estão engasgando. Os eleitores têm preferido ficar em casa em vez de votarem nos candidatos favorecidos pela direção do partido. E, como mostrou a disputa de Ocasio Cortez, um pequeno grupo de militantes comprometidos com uma mensagem popular pode vencer eleições, mesmo que seus oponentes gastem muito mais na campanha.
Considere o papel dos Socialistas Democráticos da América (DSA), cujos membros ajudaram a panfletar, telefonar para eleitores e angariar fundos para Ocasio-Cortez. O DSA agora tem mais de 50.000 membros – 45.000 a mais do que há alguns anos. Impulsionado pela ascensão de Bernie Sanders, pela desilusão dos jovens com o centro democrata e a indignação com a eleição de Trump, o DSA tem atraído atenção ampla e conquistado sua parcela de vitórias locais.
É claro que 50.000 membros num país de 330 milhões de pessoas não é grande coisa, mas com as capacidades de mobilização dos partidos políticos, sindicatos e organizações civis esvaziadas, organizações como o DSA podem ajudar a preencher o vazio. Dezenas de milhares de pessoas, se organizadas em campanhas em comum, se treinadas para falar e para se conectar com as pessoas e ajudá-las em suas lutas, podem ter um impacto nacional. Muito menos que isso já podem mudar disputas locais e trazer novas idéias e demandas para a consciência popular.
Hoje, nos EUA, a esfera eleitoral parece ser o lugar mais promissor para o avanço da política de esquerda, pelo menos no curto prazo. Só que para cada socialista concorrendo como independente, há um esforço progressista mais amplo para eleger alguém como Ocasio-Cortez através das primárias democratas. Os Justice Democrats (“Democratas da Justiça”), por exemplo, foram fundamentais para a vitória de Ocasio-Cortez, promovendo sua candidatura como parte de uma estratégia mais ampla de transformar o Partido Democrata em um veículo real de política progressista. Embora eu seja cético sobre as perspectivas de transformar o Partido Democrata em algo que possa forçar os interesses empresariais a realizar concessões duradouras, usar as cédulas democratas muitas vezes faz muito mais sentido do que dedicar esforços como um terceiro partido.
Esse tipo de estratégia pode eleger dezenas de candidatos nacionais no futuro próximo. No entanto, o verdadeiro desafio não é apenas colocar candidatos no gabinete, mas descobrir como mantê-los para posições progressistas. Embora a esquerda tenha conquistado um punhado de cargos para gente que tem demonstrado disposição para desafiar os interesses dos grandes empresários, precisamos construir uma estrutura inteira em torno de candidatos socialistas democráticos para garantir que os recém eleitos não acabem algum dia parecendo os democratas aliados das corporações.
O campo do jogo político não é nivelado – está inclinado fundamentalmente contra os trabalhadores. No fim das contas, a influência política exige recursos e os ricos têm mais recursos. Precisamos criar instituições na sociedade civil que possam ajudar a equilibrar as chances.
Agora, imagine que estamos em 2023 e que temos bancadas socialistas democráticas no Congresso estadunidense e em legislaturas estaduais, onde os eleitos com uma mentalidade parecida estão organizados. Eles concordam com um conjunto amplo de princípios, se associam a uma rede de organizações de militantes e sindicatos, e apenas aceitam dinheiro de organizações da classe trabalhadora e de pequenos doadores individuais. Nas legislaturas individuais, eles mantêm um grau de coerência – votam livremente em muitos itens, mas votam em bloco em questões programáticas fundamentais, como em oposição a guerras ou a cortes orçamentários.
Embora se relacionem de maneira construtiva com algumas formações liberais como a Bancada Progressiva do Congresso (“Congressional Progressive Caucus”), eles mantêm um perfil distinto. E, ao contrário da maioria dos políticos – que são indiferentes ou tentam reprimir organização de massa -, nossos parlamentares incentivam uma luta de classes mais ampla, enxergando nela a fonte de sua força, conforme buscam implantar políticas no interesse das pessoas comuns.
Hoje, a maioria dos políticos vem da elite, é financiada por corporações e arranja ideias para suas políticas com lobistas dos interesses empresariais. Num futuro próximo, poderemos eleger políticos da classe trabalhadora, juntá-los, encontrar uma base alternativa para financiá-los, criar institutos de pesquisa para ajudá-los a elaborar políticas e construir o poder na sociedade civil para realizar mudanças de verdade. Eventualmente, será necessário formar um partido independente – enraizado nos locais de trabalho e nas ruas – capaz de ameaçar o capital mais fundamentalmente.
Isso tudo pode soar como um sonho distante, mas é a única maneira de levarmos o renascimento do socialismo nos Estados Unidos de um surpreendente evento nos meios de comunicação para uma força que possa acabar com o sofrimento e a desesperança que tantos enfrentam neste momento.
Sobre os autores
é editor e fundador da revista Jacobin.