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As estruturas utilizadas no desenvolvimento do trabalho são de institutos fundados e controlados por militares: os Instituto General Villas Bôas, Instituto Federalista e o Instituto Sagres. Foto de Sergio Lima / Poder360

O plano olavista e ultraliberal dos militares

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Analisamos o Projeto de Nação, elaborado com recursos públicos por institutos militares e o alto comando do Exército, que tem como meta estratégica privatizar a educação e a saúde pública até 2035 e tutelar a democracia brasileira para proteger o país da "ameaça globalista".

As ações militares organizadas, ancoradas em fundações e clubes de generais aposentados, e com forte presença dos ainda fardados, configuram a linha clara de um partido político, inclusive com “financiamento público de campanha”, ainda que pouco ortodoxo. Só não está batizado e registrado por conta de técnicas de camuflagem, já que seus articuladores são os “mestres da estratégia”. Entretanto, o “Partido Militar do Brasil”ou “Partido Fardado”, teve um longo período para implementar suas idéias, executar seu projeto, mostrar seu grau de competência, “alavancar o progresso”, tendo até um presidente-títere em suas mãos. 

Teve forte apoio legislativo, mesmo que para isso tivessem que cohabitar com a corrupção insaciável do Centrão, mas não pareceu incomodado com isso (Heleno, dizem, até esqueceu a letra do grande Ary do Cavaco “Se gritar pega ladrão”). Teve muito mais: verbas fartas para suas licitações, não faltou Viagra, próteses penianas, leite condensado, uísque, filé e salmão. 

Teve até uma pandemia, onde sua expertise em crises, excelência em logística, sua articulação de terra, mar e ar, seu vasto quadro de pessoal, sua presença em todo o território nacional, seriam trunfos para apresentar soluções, agir, ajudar, resolver e ganhar credibilidade junto à população. Mas, por indolência, despreparo, incompetência e a priorização dada às mamatas e a vantagens pessoais incofessáveis, conseguiram, no máximo, serem os coautores “disso tudo que tá aí”: a bagunça, a esculhambação, a derrocada econômica, o caos, o genocídio e a fome.  

Mas, como se fossem parceiros de um governo de notável sucesso, se dispõe a prorrogar sua influência, repassar sua sapiência e empacotar seu “legado”, no que chamam pomposamente de Projeto de Nação (PdN) – em outros momentos de “Grande Estratégia Brasileira”. Que bem poderia se chamar “Plano Pinochet”, pela combinação de pobreza metodológica, arroubos de grandeza e primarismo ideológico, tudo isso empacotado em autoritarismo. 

“O objetivo é rentabilizar negócios que só seriam viáveis com graves prejuízos aos mais pobres e farta transferência de renda e de riqueza do Estado aos privilegiados de sempre.”

O PdN, na verdade, não passa de uma paródia da Doutrina de Segurança Nacional, surgida num contexto de “caça aos comunistas”, no auge da Guerra Fria, que é o ciclo imaginário onde ainda vivem muitos dos medalhados generais brasileiros. Esse grupo teve o governo e, por decorrência, o país em suas mãos. Gostaram tanto que ambicionam mantê-lo assim até 2035. Mas, para isso, a “Grande Estratégia Brasileira” apresenta um arremedo de plano que, no máximo, serviria para a montagem de uma republiqueta militarizada, subjugada a interesses externos e com uma visão medíocre para a solução dos nossos graves problemas sociais. 

Na prática, essa peça literária enfatiza o lugar comum, debocha da verdadeira crise e defende ardorosamente a manutenção do poder nas mãos deles mesmos, seus autores. Os militares brasileiros gostaram mesmo de passar vergonha. 

Como fizeram e financiaram

A fase metodológica do estudo inicia, mais uma vez, usando recursos públicos sem nenhuma formalização, sem uma mera ordem de serviço, ou como diria o gaúcho Mourão, “no peitaço”. O vice-presidente, o ministro do Turismo e  o Comandante Militar do Sul conclamam funcionários federais a preencher uma consulta online com 37 temas estratégicos que poderiam afetar o país até 2035, sustentados por quatro eixos: gestão estratégica e estratégia nacional; desenvolvimento; relações externas, segurança nacional e inteligência estratégica; e bem-estar nacional. O questionário, de acordo com o Sagres, foi apresentado em reuniões a 17 ministérios, universidades e entidades patronais, como a CNI e a Fiesp, junto com os objetivos da pesquisa e a forma de preenchimento.

As estruturas utilizadas no desenvolvimento do trabalho, recebidas as informações da enquete, são de institutos fundados e controlados por militares: os Instituto General Villas Bôas, Instituto Federalista e o líder da empreitada, o Instituto Sagres. O extenso material não cita a origem dos recursos para a execução do trabalho, mas o Instituto Sagres, especialmente, tem outras fontes governamentais de renda:  recebeu R$ 170 mil da Codevasf  (estatal generosa no uso de seus recursos, por isso, sobre ela não recai a ameaça da sanha privatista), da Embrapa, da Secretaria da Receita Federal e de vários ministérios, totalizando R$ 780.000,00.

O Sagres é presidido pelo general da reserva, Raul José de Abreu Sturari, que já foi secretário parlamentar no Gabinete do Senador Girão, emprego esse baseado, provavelmente, na atração de semelhantes. Outro membro relevante é o general Luiz Eduardo Rocha Paiva, também da reserva, que já foi presidente do grupo Terrorismo Nunca Mais, o tristemente notório Ternuma, ONG do coronel Brilhante Ustra, torturador da Ditadura e guru de Bolsonaro. E, dentre outros currículos diversificados faz parte do Sagres o general Ridauto Lúcio Fernandes, especialista em Logística colocado no Ministério da Saúde por Pazuello e que fez parte do fiasco monumental (e letal) que foi a gestão militar do ministério durante a fase mais aguda da pandemia. Ele foi defensor do Estado de Sítio para lidar com a Covid-19.

“Reuniram três Institutos dependentes de verba pública para desenvolver e publicar essas pérolas do reacionarismo e combater o globalismo.”

O Instituto Federalista não tem registro de recebimento de verbas públicas e é presidido por Thomas Korontai, apresentado como “autor do ensaio de uma nova constituição brasileira” com “reconhecida atuação por sua defesa à transparência eleitoral”. Não precisa dizer mais nada. Já o Instituto General Villas Boas, cujo fundador não é nenhum baluarte da democracia, tem convênios com ao menos quatro órgãos federais: Ministério da Educação, Secretaria Especial da Cultura, Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (Ibict) e Ministério da Ciência e Tecnologia. Um dos convênios com o MEC é para o lançamento de uma série de cem livros chamada Coleção Pensadores do Brasil. 

Seria um contrassenso dizer que nos aprofundamos no texto, dado que ele é, na essência, muito raso. Mas fizemos a chamada “leitura crítica”. De saída, surpreende-nos a narrativa no presente do indicativo, com os supostos acontecimentos futuros de 2035 e a previsão, por exemplo, de uma pandemia do “Xvírus” em 2027. O texto é escrito com grandiloquência, recheada de uma salada de conceitos: “os cidadãos brasileiros, em sua maior parte, identificam-se como conservadores evolucionistas, no campo psicossocial, e liberais, porém, conscientes da responsabilidade social de apoiar, com políticas públicas sustentáveis, as camadas carentes da sociedade.”

Olavismo cultural

O resultado final em 93 páginas revela que os militares democratas e nacionalistas foram alijados de qualquer discussão. Restaram apenas os herdeiros de Sylvio Frota e Brilhante Ustra, a extrema direita truculenta e entreguista, a serviço das elites nativas e dos interesses da “primeira potência”. O texto, genericamente, reproduz o “pensamento geopolítico” de Olavo de Carvalho, repete as teses antiambientalistas de Mourão, defende o atual posicionamento pró-devastação, reforça as críticas de Bolsonaro à atuação do Judiciário e propõe ações onde o liberalismo sem freios beira a ingenuidade. No contexto atual países sérios, incluindo potências capitalistas, protegem sua economia mesmo que isso requeira intervenção estatal. Aqui, os militares e seu PdN propõe reduzir o Estado e entregar, gentilmente, as chaves para o mercado.

Por exemplo, a análise do papel do vasto potencial do país para negócios do campo começa por um aspecto moralmente duvidoso e tecnicamente defeituoso: enquanto a fome avança, o PdN repete a balela da Rede Globo do “agro é pop, agro é tudo”,  colocando o agronegócio como fator de peso para o desenvolvimento e segurança alimentar, enquanto sabemos que o agro só garante mesmo suas fartas exportações dolarizadas. A agricultura familiar responde por 75% dos alimentos que chegam à mesa do brasileiro, mas sobre ela o PdN não dedica uma linha. E, suportando sua tese da essencialidade do agro, retomam ideias do ditador de plantão lá no lançamento da Transamazônica, Emílio Médici, que visavam a exploração da região a serviço de latifundiários, desmatadores e grileiros, sem respeito às questões ambientais e aos povos originários. 

“Implantar o Zoneamento Econômico e Ecológico (ZEE) Regional e remover as restrições da legislação indígena e ambiental, que se conclua serem radicais, nas áreas atrativas do agronegócio e da mineração”. O Zoneamento Ecológico e Econômico (ordem correta) é um processo de construção de mapas e de informações que somam três variáveis fundamentais: natureza, sociedade e legislação ambiental, onde é possível reler e ordenar solo, geologia, clima, cobertura vegetal, uso e ocupação da terra. A visão militaresca reforça o aumento da desigualdade, da desocupação, do êxodo rural, da devastação do meio ambiente, do roubo de terras públicas e da invasão agressiva de terras dos povos originários. 

Consagra a anomalia de ter um país de dimensões continentais reservar a maior parte de sua área agriculturável para especulação, atividades que levam a devastação, afugentam o homem e são de baixo valor agregado para a composição do PIB. E o que o país realmente necessita é implementar uma política de aproveitamento econômico dos biomas nacionais, como a Amazônia, o Cerrado e a Mata Atlântica. Sem queimadas, sem desmatamento e sem grilagem, possibilitando uma agricultura que ofereça ocupação, renda e futuro a milhões de cidadãos. A superação da trágica subutilização das terras, hoje dominadas e invadidas pelas pastagens e plantio de commodities, teria grande impacto social e econômico. 

Em outros parágrafos, como uma idéia central do estudo, o PdN propõe uma superestrutura chamada de Centro de Governo (CdG), incumbida de garantir que os ministérios e instituições públicas sigam os princípios preconizados em um só projeto, não muito diferente das funções desempenhadas pelo Partido Comunista e pelo Exército Chinês. Diz o texto: 

“essa flexibilidade proporciona ao Centro de Governo (CdG) ferramentas para vencer uma série de obstáculos, no sentido de orientar, coordenar e garantir a convergência de estratégias e ações estratégicas, ao tempo em que permite a aplicação de técnicas, ferramentas e práticas flexíveis e adequadas às diferentes realidades existentes entre instituições e nas unidades da federação. O CdG foi um dos fatores que possibilitou ao Brasil ingressar na OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), em meados da década de 2020”.  

Aqui aparece uma contradição curiosa pois, propositalmente ou não, os consultores preconizam um modelo próximo ao chinês, tão hostilizado por Bolsonaro, família e “staff”, mas em outro trecho do trabalho mencionam conflitos entre Estados Unidos e aliados, de um lado, e China e Rússia, de outro, “tendo como palco a Guiana e sua produção de ouro e, especialmente, de bauxita”, insinuando, desta vez, os chineses como vilões.

E adentram no emaranhado ideológico: 

“Falta de autonomia política, econômica, militar, científico-tecnológica, diplomática e cultural, diante do poder econômico e financeiro da Elite Globalista, que amplia sua capacidade de influência mundial. Domínio da mídia internacional e cooptação de grande parte da mídia nacional, inclusive ONGs e centros de estudos estratégicos (Comissão Trilateral, Diálogo Interamericano, CFR – Council on Foreign Relations e outros) ligados ao movimento e às bandeiras globalistas, seja por idealismo ingênuo, seja por outros interesses. Deficiente espírito cívico e patriótico da Nação, tendente a enfraquecer a coesão social, o que fragiliza o Brasil no enfrentamento desse desafio e de outros da agenda global”.

Aqui, fica explícita a visão das lideranças das fundações sobre o globalismo (ou o antiglobalismo, que seria a resistência a ele): propõe um equilíbrio precário, chamado de “autonomia diplomática”, que prevê o país sem ligações mais formais com “nenhuma das duas superpotências”. Mas a China faz parte do BRICS, assim como a Rússia (não é uma superpotência econômica, mas militar) e o Brasil já esteve bastante alinhado com os membros do bloco, com ganhos significativos e projetando uma evolução consistente. 

Os recuos “estratégicos” do governo Bolsonaro, entretanto, apontaram para um novo alinhamento na coleira do Tio Sam. Na interpretação dos “pensadores” bolsonaristas, globalismo é uma suposta ação planejada das elites internacionais para conduzir a globalização de acordo com valores liberais e, na prática, contrapõe a sua geopolítica militar. Na ausência de Golbery, e sob as luzes de “pensadores” do porte de Olavo e Ernesto Araújo, criam um espantalho, que não passa da versão nativa de regimes como os de Erdogan, Orban, Duterte, Lukashenko e seus movimentos populistas nacionalistas que defendem o endurecimento em questões como migrações, comércio e investimentos internacionais, preservação ambiental e preocupações com as mudanças climáticas, dificultando ou impedindo a participação de seus respectivos países em acordos globais que evoluam nessas questões.

Tudo começou, não por acaso, com Trump na Assembleia Geral da ONU de setembro de 2018,  quando declarou “o fim da ideologia globalista” e deu boas vindas à “doutrina do patriotismo”, reforçado em seguida por seu jagunço midiático, Steve Bannon, que acrescentou que “a política externa deve ser um bastião dos valores conservadores do povo contra o cosmopolitismo liberal das elites globalistas”. Portanto, o PdN compra as ideias de gente com esse viés ideológico, reforça a concepção de que o globalismo não é apenas uma ideologia, mas uma conspiração de dominação global que visa erguer-se sob os escombros das culturas tradicionais, que age como uma moral secular, cosmopolita e esquerdista, sob o patrocínio de órgãos como ONU, UE, ONGs internacionais. Tudo financiado por bilionários “esquerdistas” como o George Soros. 

Resumindo, reuniram três Institutos dependentes de verba pública para desenvolver e publicar essas pérolas do reacionarismo e combater o globalismo. E, contraditoriamente, propõe integrar o Brasil à OCDE e tem propostas afinadíssimas com instituições globalistas como o Banco Mundial e o FMI, tais como o EaD, a municipalização do ensino e a priorização da “Indústria 4.0”. 

Mercantilização da educação

No importante tópico sobre educação o PdN crava sua opção pela educação paga. Exceto, é claro, a gratuidade e, além dela, a remuneração via soldo de alunos nas escolas preparatórias e academias militares. Para isso, não há proposta de mudanças. Mas a Grande Estratégia Brasileira mira, com mudanças profundas de conotação puramente ideológica, a educação básica e a superior. 

“Um marco importante para a melhoria de desempenho das universidades públicas, mas que sofreu forte resistência para vingar, foi a decisão de cobrar mensalidades/anuidades, segundo critérios que levaram em conta a renda pessoal do aluno e ou de seu responsável, o número de alunos sob o mesmo responsável, a concessão de bolsas a alunos de camadas carentes e para os de elevado nível de desempenho. Os avanços foram lentos, mas com ótimo resultado, gerando reflexos positivos nos cômputos das avaliações do SINAES (Instituições, Curso, Desempenho dos Alunos) e, em consequência, uma pequena melhora no posicionamento das IES brasileiras nos rankings mundiais de qualidade.”… “Ideologização nociva dos sistemas de ensino e de cultura, com os escalões superiores dominados por lideranças ideológicas, radicais e sectárias, não democráticas, o que colabora para a polarização da Nação, enfraquecendo sua capacidade de enfrentar o jogo do poder mundial.”

Sabidamente, uma das obsessões do conservadorismo de direita e extrema direita é a educação. No Brasil, com predominância no governo de Bolsonaro e seus generais, vemos o esforço concentrado sob a fachada da “Escola Sem Partido” e das novas escolas militarizadas. Hipocritamente, dizem querer eliminar a “doutrinação ideológica” e, para isso, reforçam suas ações em projetos de lei apresentados nas câmaras, assembléias para espalhar escolas que fariam, estritamente, doutrinação ideológica. Atropelam conceitos fundamentais na educação, como a liberdade docente, leis vigentes na  Constituição, vilipendiam a base do aprender a conhecer, a fazer, a ser e a conviver, os quatro pilares de uma educação para o século XXI. 

Bolsonaro e seu ministério errático, numa sucessão de ineptos fracassados ocupando a pasta da Educação, fez um ataque delirante às universidades públicas. O PdN acrescenta a cobrança de mensalidades, cujo arcabouço já vem sendo construído a partir de cortes orçamentários, forçando o subfinanciamento do ensino e da pesquisa, e passando pela destruição do modelo democrático da eleição dos reitores, retomando a nomeação de reitores-interventores, prática da ditadura. 

Mas a ênfase do PdN em educação não se restringe as mensalidades: tem uma “aproximação com o setor produtivo” que vai muito além do projeto no papel, com ataques diretos à liberdade acadêmica, passando pela precarização dos contratos dos docentes, a supervisão ideológica dos planos de estudo e a sistemática nomeação para funções universitárias relevantes de ideólogos de direita, quase sempre sem as necessárias qualificações acadêmicas. 

Fim da saúde pública

Em sua retórica verborrágica o Projeto de Nação fala em liberalismo social, ideologia política que, em tese, “crê na liberdade individual e apoia a economia de mercado e a expansão dos direitos civis e políticos dos cidadãos e crê que o papel do governo incluir também o cuidar dos mais pobres, promover um sistema de saúde pública e cuidar principalmente da educação básica dos cidadãos” Mas, na prática, propõe o fim da universalidade e gratuidade do SUS, pilares de um dos sistemas de saúde mais completos e abrangentes do mundo: “Além disso, a partir de 2025, o poder público passa a cobrar indenizações pelos serviços prestados, exclusivamente das pessoas cuja renda familiar fosse maior do que três salários mínimos.” 

O estudo prevê o pagamento de co-participações a partir de uma tabela de referência criada por especialistas, a serem pagas por pessoas cujas famílias tenham renda que ainda as posicionam como pobres (3 salários mínimos). E, na linguagem futurológica, projeta:

“Essa medida encontrou forte resistência, especialmente a oposição política, mas atualmente comprova-se que não somente trouxe mais recursos para o SUS como também racionalizou atividades e procedimentos — o que contribuiu para o aperfeiçoamento da gestão”.

Pode-se dizer, ironicamente, que um dos méritos do PdN é seu vínculo com a linha já adotada pela gestão de seu presidente-títere. Hoje, recursos destinados para pagar salários dos profissionais de saúde, são desviados de suas finalidades e utilizados para financiar gastos das Forças Armadas (conforme denúncia da Comissão de Orçamento e Financiamento/CNS), que relata que o Ministério da Defesa subtraiu R$ 150 milhões do SUS para consertar aviões e comprar equipamentos de escritório. 

A escassez de recursos precariza o trabalho no sistema único, cria a instabilidade no vínculo empregatício, joga o funcionamento nas mãos de OS’s, quase sempre suspeitas, e inviabiliza o funcionamento da estrutura responsável pela saúde dos brasileiros. O processo de fragilização do sistema, iniciado com o desfinanciamento, desemboca no fim da gratuidade, obviamente, pela supressão brutal de recursos.

Lucro acima de tudo

O texto, repetidamente, remete ao ultraliberalismo, farol da extrema direita, com dogmas contra toda forma de regulação, que prega que as maiores rentabilidades devem provir da maior exploração do trabalho, dos consumidores e do Estado. No Brasil esse flagelo já apresentou sua conta à sociedade com as reformas trabalhista e da previdência, forçando menores custos de regulação, estabelecendo o teto de gastos e forçando as privatizações. 

Para o ultraliberalismo, o mercado deve gerir a vida econômica e a vida social, concentrando renda para potencializar o lucro de poucos além de promover, sem abstrair o uso da força, as mudanças necessárias para a vigência plena da ideologia. O objetivo, por demais explícito no PdN é rentabilizar negócios que só seriam viáveis com graves prejuízos aos mais pobres e farta transferência de renda e de riqueza do Estado aos privilegiados de sempre. É, rigorosamente, um projeto de subdesenvolvimento econômico e social. 

“É, rigorosamente, um projeto de subdesenvolvimento econômico e social.”

O que essas fundações, na verdade meras porta-vozes de militares fazem, com muita ênfase, é a defesa de um liberalismo muito peculiar, que colide frontalmente com o conceito de Nação, pois defende a desnacionalização de setores econômicos relevantes e aumenta exponencialmente a dependência de investimentos estrangeiros. Elas não partem de uma base real, de dados confiáveis, para então projetar o futuro e, sim, baseados numa metodologia mambembe, partem de uma visão ideológica de mundo, fascista, entreguista e retrógrada para chegar ao objetivo não declarado: uma ditadura maquiada. 

Concretamente o projeto é redundante pois sintetiza tudo o que vem sendo imposto, gradual e disfarçadamente à sociedade brasileira, em várias frentes, desde 2108, por políticos fisiológicos, militares (ocupando mais de 6.000 cargos no governo) com dupla renda, lideranças evangélicas de moral duvidosa, agrotrogloditas, armamentistas, olavistas, saudosistas da ditadura, ultra-conservadores e toda uma gama de vanguardistas do atraso. 

O PdN não explicita, mas também não esconde que, uma vez que as Forças Armadas e as polícias detém o monopólio da violência do Estado, do uso da força para o controle da ordem e da segurança, também podem intervir formalmente no processo político. Em suma, preconiza uma tutoria à democracia, já que a própria sociedade lhes outorgou, mesmo que para outros fins, os recursos, as armas e os homens. Por tudo isso, o trabalho dos Institutos Sagres, Villas-Boas e Federalista, com o beneplácito do alto comando militar e de lideranças de extrema direita, é deficiente em sua concepção e brutal em sua intenção.

Sobre os autores

é administrador de empresas, com Especialização em Administração Hospitalar (PUCRS) e Marketing (FGV) e Mestrado em Administração e Negócios (PUCRS). Consultor Hospitalar, tem como hobby ler as notícias diárias e, a partir disso, escrever notas críticas.

Cierre

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Published in América do Sul, Análise, Cultura, Militarismo and Política

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