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Meninas palestinas no Campo de Refugiados de Bureij em Gaza, em 16 de junho de 2024. (Majdi Fathi / NurPhoto via Getty Images)

Comissão da ONU considera Israel culpado de crimes contra a humanidade

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Tradução
Sofia Schurig

Um novo relatório da ONU conclui que Israel tinha a intenção de assassinar civis em massa, causar destruição urbana em larga escala e punir coletivamente os palestinos em Gaza — ao mesmo tempo que os mantinha reféns de seus objetivos políticos.

A Comissão Independente Internacional das Nações Unidas sobre o Território Palestino Ocupado emitiu sua “primeira investigação detalhada sobre os eventos que ocorreram desde 7 de outubro de 2023”. O relatório responsabiliza a ocupação israelense pela situação catastrófica contínua em Gaza. No entanto, também sugere a possibilidade de que 7 de outubro seja um momento decisivo para uma ocupação israelense ainda mais dura, a menos que o direito internacional seja urgentemente aplicado.

Enquanto tanto o Hamas quanto Israel são considerados culpados por crimes de guerra (incluindo violência sexual), Israel também é sancionado por cometer “crimes contra a humanidade de extermínio, perseguição de gênero direcionada a homens e meninos palestinos, assassinato, transferência forçada, tortura e tratamento desumano e cruel”.

Em clara e deliberada violação do direito internacional, Israel tinha a intenção de cometer esses crimes: assassinar civis em massa, causar destruição civil em larga escala e punir coletivamente e desumanizar os palestinos em Gaza. Palestinos foram assassinados. Eles não morreram como danos colaterais ou vítimas não intencionais de operações militares israelenses, mas como alvos deliberados de Israel.

O imenso número de vítimas civis em Gaza e a destruição generalizada de objetos e infraestruturas civis foram o resultado inevitável de uma estratégia executada com a intenção de causar o máximo de dano, ignorando os princípios de distinção, proporcionalidade e precauções adequadas. O uso intencional de armas pesadas com grande capacidade de destruição em áreas densamente povoadas constitui um ataque intencional e direto à população civil.

A destruição generalizada e sistemática de bairros inteiros em Gaza é consistente com a aplicação da doutrina Dahiya em Gaza, na qual a infraestrutura civil é deliberadamente destruída como parte de uma estratégia de punição coletiva, reminiscente da guerra de Israel contra o Líbano em 2006.

A comissão deixa a questão do genocídio para a investigação em curso da Corte Internacional de Justiça julgar. No entanto, acusa Israel de manter toda a população civil em Gaza como refém para alcançar seus já declarados objetivos políticos e militares. Se Israel falsamente e persistentemente acusou o Hamas de usar “escudos humanos” desde 2008, a ONU mais uma vez descobriu que, na prática, é Israel que emprega essa tática ilegal. De fato, quando adversários do Ocidente fazem reféns, autoridades e veículos de mídia os rotulam de terroristas. Ao punir violentamente civis palestinos para alcançar seus objetivos políticos, Israel emprega um caso clássico de terrorismo.

Como declarado na Carta Aberta de Oxford sobre a Crise Humanitária em Gaza já em 20 de outubro de 2023: pensar que as atrocidades perpetradas pelo Hamas justificam a crise humanitária atual em Gaza é indulgir em um princípio central do terrorismo — que todos os cidadãos devem pagar pelos crimes de seus governos — assim como a prática central do terrorismo: punição coletiva. Conforme mostrado pelo jornalista investigativo Yuval Abraham, Israel de fato usa táticas de terror sistematicamente em Gaza.

Além da retaliação, Israel também usou a ajuda humanitária como arma em sua guerra contra Gaza e empregou a fome como arma de guerra. A comissão identificou “uma intenção de instrumentalizar e usar como arma o fornecimento de necessidades básicas, para manter a população da Faixa de Gaza refém a fim de alcançar objetivos políticos e militares, incluindo o deslocamento forçado de civis do norte da Faixa de Gaza e a libertação de reféns israelenses.”

Enquanto as necessidades básicas de subsistência são bloqueadas por um cerco militar, a “elevada insegurança alimentar aguda” é “o resultado composto da destruição e do impedimento da produção local de alimentos, incluindo agricultura, pesca e panificação.”

As necessidades humanas essenciais dos palestinos são violadas e degradadas de maneira cruel por Israel, resultando em que: “Até março de 2024, a situação continua a se deteriorar; 1,1 milhão de pessoas enfrentam níveis catastróficos de insegurança alimentar.” Uma política de desumanização em massa deliberada dos palestinos é identificada aqui.

Se isso não é suficientemente condenatório, o relatório acusa Israel não apenas de falhar em proteger seus cidadãos no dia 7 de outubro de 2023, mas, através de sua ocupação ilegal, de ser fundamentalmente responsável pela causa raiz da violência em Israel-Palestina. Esse contexto explicativo é crucial.

Tanto o ataque de 7 de outubro em Israel como a subsequente operação militar de Israel em Gaza devem ser vistos no seu contexto adequado. Esses eventos foram precedidos por décadas de violência, ocupação ilegal e negação por parte de Israel do direito dos palestinos à autodeterminação, manifestados em contínuos deslocamentos forçados, desapropriação, exploração de recursos naturais, bloqueio, construção e expansão de assentamentos, e discriminação sistemática e opressão do povo palestino.

A ocupação como causa raiz é invocada também na conclusão do relatório. Ela está na base da violência sexual e de gênero que Israel utiliza intencionalmente contra os palestinos para humilhar sua comunidade. “Essa violência está intrinsecamente ligada ao contexto mais amplo de desigualdade e ocupação prolongada, que têm proporcionado as condições e a justificativa para crimes baseados em gênero, para acentuar ainda mais a subordinação do povo ocupado.”

Qual, então, é a solução para os atos retaliatórios e “persecutórios” de Israel?

O fim da ocupação israelense. Como afirma o relatório: “Esses crimes devem ser abordados enfrentando sua causa raiz; através da desmontagem das estruturas historicamente opressoras e do sistema institucionalizado de discriminação contra os palestinos, que estão no cerne da ocupação.”

Apesar do discurso oficial sobre combate o terrorismo e do direito falso que Israel tem de se defender contra aqueles que ocupa, identificar a ocupação como a razão subjacente para a violência é crucial. Isso coloca a responsabilidade diretamente sobre Israel, onde a paz só pode ser alcançada “pela estrita aderência ao direito internacional” — através do fim da ocupação israelense e do reconhecimento do direito palestino à autodeterminação.

Em um ambiente onde explicar o contexto e identificar as causas raízes são frequentemente associados ao antissemitismo ou à justificação do terror, a conclusão sóbria da comissão é uma poderosa defesa dos oprimidos.

É importante destacar que um aviso é dado ao final. O dia 7 de outubro pode muito bem marcar não a paz, mas sim uma expansão da ocupação. É um julgamento histórico significativo para se contemplar: “7 de outubro de 2023 marcou um ponto de virada claro tanto para israelenses quanto para palestinos, e representa um momento crucial que pode mudar a direção deste conflito; com um risco real de solidificação e expansão ainda maior da ocupação.”

Embora Israel, de acordo com suas obrigações legais como ocupante, deva reparar os palestinos pelos danos causados em Gaza e reconstruir Gaza agora, é provável que faça o oposto: fortalecer sua ocupação, incentivar ainda mais seus colonos na Cisjordânia e bloquear qualquer restituição significativa da vida palestina em Gaza.

Em parte, isso é um julgamento sobre o efeito catastrófico da operação militar do Hamas em 7 de outubro sobre os palestinos. É um reconhecimento claro de que o atual equilíbrio de poder vai contra os direitos palestinos — além de um reconhecimento implícito dos obstáculos que estão no caminho para transformar os verdadeiros ativos do direito internacional em realidade política.

Colocar um fim à ocupação israelense requer uma estratégia palestina coerente de emancipação que utilize o impressionante apoio popular generalizado a esta causa justa em todo o mundo e ajude a transformar a solidariedade global em políticas estatais, isolando Israel internacionalmente e o forçando a pagar os custos de sua ocupação ilegal. Este é o desafio que os palestinos enfrentam agora após a nakba de Gaza.

Sobre os autores

Bashir Abu-Manneh
é chefe do departamento de clássicos, inglês e história na Universidade de Kent e editor colaborador da Jacobin.
Cierre

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Published in Guerra e imperialismo, Militarismo, Notícia and Oriente Médio

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