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Michel Barnier durante um discurso no Hotel Matignon em Paris, França, em 5 de setembro de 2024. (Nathan Laine / Bloomberg via Getty Images)

Michel Barnier está no cargo, mas Marine Le Pen é quem manda

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Tradução
Caue Seignemartin Ameni

Emmanuel Macron nomeou Michel Barnier como primeiro-ministro da França, após garantir um acordo com Marine Le Pen. A criação de um governo dependente de sua bênção é mais um passo na marcha da extrema direita em direção ao poder.

À medida que os resultados do primeiro turno das eleições francesas em 30 de junho chegavam, o veterano político gaullista Michel Barnier soou o alarme. Seu partido Les Républicains (LR) pareciam enfrentar um desastre, com menos de 7% dos votos. Antes da eleição, o partido sofreu uma divisão prejudicial, pois uma minoria barulhenta fez uma aliança com o partido Rassemblement National (RN) de Marine Le Pen. Barnier se opôs à posição deles — mas também alertou sobre o “perigo da esquerda” para a República.

No segundo turno, ele insistiu, era necessário “construir uma barragem contra a LFI [França Insubmissa de Jean-Luc Mélenchon] e o RN”. Isso contrariava a ideia estabelecida de uma “frente republicana” unindo democratas contra a extrema direita. No entanto, em dezenas de distritos eleitorais, o segundo turno em 7 de julho ofereceu uma disputa direta entre a LFI e o RN de Le Pen. Nessas disputas, os eleitores do Les Républicains se dividiram em favor da opção de extrema direita, por uma estimativa de 38% a 26%. Não mais a considerando um pária, eles a apoiaram a extrema direita até mesmo contra os verdes e socialistas de centro-esquerda.

Esses eleitores de Les Républicains eram muito poucos para dar a Le Pen uma maioria. A maioria da esquerda (e pouco mais da metade dos centristas) votou taticamente para bloquear seu partido e surpreendeu as expectativas de que ele estava se aproximando do poder. No final das contas, o Nouveau Front Populaire de esquerda obteve 192 assentos no Parlamento, o campo de Emmanuel Macron 166, e os aliados de Le Pen apenas 142, em um parlamento profundamente dividido. No entanto, o presidente logo deu à extrema direita a iniciativa novamente — entregando a ela um papel decisório que culminou na última quinta-feira na nomeação de Barnier como primeiro-ministro.

Enquanto o presidente descartou na semana passada um governo liderado pela aliança de esquerda, suas consultas com Le Pen buscaram sua aprovação antes que um novo bloco direita pudesse se formar. Le Pen ameaçou retirar votos de candidatos que pudessem fazer acordos com a centro-esquerda, ou mesmo um direitista odiado por seu partido como Xavier Bertrand. Mas ela disse a Macron que daria uma chance a um governo de Barnier, mas, para isso, exigiu publicamente que ele “respeitasse” a agenda de seu partido RN e seus mais de 10 milhões de eleitores.

Quando Macron convocou essa votação antecipada em junho, apesar dos péssimos resultados de seu partido nas pesquisas, parecia que ele estava encontrando uma maneira de repassar a responsabilidade governamental para a extrema direita, mesmo sob sua presidência. Com o RN liderando as pesquisas pré-eleitorais, sua vitória parecia ser o resultado mais provável. Mas, os resultados do segundo turno em 7 de julho pareciam subverter tais prognósticos. No entanto, no final das contas, eles estavam certos o tempo todo. Barnier, do quarto maior bloco político da França, agora será o primeiro-ministro, aliado aos macronistas e dependente do favor de Le Pen para governar.

A esquerda está denunciando uma traição ao sucesso eleitoral do Nouveau Front Populaire. Para Mélenchon, o presidente está “negando o resultado da eleição que ele mesmo convocou”. A líder da LFI no Parlamento Europeu, Manon Aubry, também disse que os “resultados das urnas foram apagados” e falou que “Barnier foi nomeado primeiro-ministro com a bênção da extrema direita”. Enquanto alguns na ala mais centrista do Partido Socialista podem ter favorecido um governo amplo abrangendo centro-esquerda e centro-direita, no geral os partidos dessa aliança de esquerda alegaram que o resultado de 7 de julho expressou uma demanda popular por uma virada para a esquerda.

A criação de um governo dependente da bênção de Le Pen é outra demonstração no “mainstreaming” de que seu partido é adorado pelas elites – embora prometa combatê-lo. Mas há uma lógica mais profunda na escolha de Macron. Barnier foi escolhido para aprovar um orçamento — uma tarefa difícil, dado não apenas o parlamento fragmentado da França, mas também os procedimentos disciplinares europeus que pairam sobre um país com a maior dívida da União Europeia (UE), em termos absolutos, e um déficit de 5,5%. Mesmo com seu histórico como uma figura institucional da UE capaz de ganhar favores em Bruxelas, Barnier certamente tem uma chance maior do que a esquerda de formar uma maioria ad hoc para seus planos de gastos, talvez dependente da abstenção de parlamentares do RN que prometem sobriedade nas contas públicas.

Algumas das posições de extrema direita de Barnier, alardeadas em sua candidatura pelo Les Républicains antes da eleição presidencial de 2022, são passíveis de convergências com o campo de Le Pen. Naquela disputa, ele divulgou a ideia de uma moratória de 3 a 5 anos sobre a migração para a UE e o retorno do serviço militar e patrulhas do Exército em comunidades onde a polícia teria perdido o controle. Em resposta à sua nomeação, a sobrinha de Le Pen, Marion Maréchal — em geral uma radical anti-imigração mais linha-dura — pediu ao novo primeiro-ministro que cumprisse essas promessas do passado. Naquela campanha, Barnier, como a maioria dos outros candidatos do partido Les Républicains, também era afavor do aumento da idade da aposentadoria para 65 anos.

Ao escolher “não frear” a nomeação de Barnier, Le Pen busca dar uma demonstração de responsabilidade institucional. Uma comparação, embora limitada, poderia ser feita com a abordagem de Giorgia Meloni em relação ao governo de “unidade nacional” italiano liderado pelo ex-banqueiro Mario Draghi em 2021–22, onde ela insistiu que adotaria uma abordagem “construtiva” em vez de “política partidária” e, em geral, evitou duras críticas ao tecnocrata. Essa posição retórica permitiu que o partido Fratelli d’Italia de Meloni arrebatasse eleitores de outros partidos insatisfeitos com o governo (as outras principais forças de direita se juntaram à coalizão de Draghi), ao mesmo tempo em que se posicionava como séria e pronta para assumir altos cargos.

Mas as diferenças também importam. Ao contrário do caso italiano, a extrema direita francesa tem que lidar com uma considerável oposição de esquerda, que certamente destacará sua cumplicidade com políticas antissociais de corte de orçamento. Isso importa especialmente porque este governo não chega em um período de estímulo fiscal, mas de austeridade iminente, enquanto as autoridades da UE fecham as torneiras dos gastos pós-pandemia. A julgar pela recente campanha eleitoral, a RN provavelmente navegará por isso adotando uma posição de duas caras: exigindo um desconto orçamentário da UE, aceitando grandes planos de gastos caso haja uma redução na idade da aposentadoria – “adiados por enquanto” – e pedindo cortes para atingir as categorias que mais demoniza.

Em todo caso, podemos ter certeza de que esse arranjo tem uma vida útil curta e que Le Pen não se amarrará a essa posição por todo o mandato até a eleição presidencial de 2027. Este é um governo provisório, bem aquém da maioria na Assembleia Nacional e muito possivelmente destinado a terminar com novas eleições em dez meses. Pode ser que Le Pen tenha se encurralado e que partes de sua base exijam uma oposição mais intransigente contra Barnier. Mas provavelmente muito mais verão o RN exercendo influência crescente sobre o governo da França e quebrando as barragens anteriores contra ele.

Sobre os autores

é historiador do comunismo francês e italiano. Ele está atualmente escrevendo um livro sobre a crise da democracia italiana no período pós-Guerra Fria.

Cierre

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Published in Análise, DESTAQUE, Europa, Extrema-direita and Política

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