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Thomas Sankara speaks in Paris, France, on October 5, 1983. (Alain Mingam / Gamma-Rapho via Getty Images)

Justiça para Thomas Sankara

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Tradução
Cauê Seignemartin Ameni

Na semana passada, Blaise Compaoré foi preso por ter participado do assassinato do líder revolucionário de Burkina Faso, Thomas Sankara – mas somente a libertação da África do neocolonialismo e um acerto de contas com as antigas potências coloniais podem trazer a verdadeira justiça que Sankara merece.

Após uma longa batalha legal que durou quase três décadas, o ex-presidente de Burkina Faso, Blaise Campaoré, foi condenado na semana passada à prisão perpétua por seu papel no golpe de Estado de 1987 que derrubou o revolucionário marxista pan-africano Thomas Sankara.

“[Estou] orgulhoso de ter um país onde a justiça funciona”, declarou o advogado da família Sankara, Guy Herve Kam, após receber o veredicto. Mas com a morte de Sankara extinguindo a Revolução Burquina antes que ela pudesse realmente se concretizar, e seu principal conspirador julgado apenas 30 anos após o fato, alguns sentem que a justiça foi feita, mas é limitada.

“Che Guevara da África”

Outrora braço direito de Sankara, Compaoré foi uma liderança no golpe de 1983 que o levou ao poder. No rescaldo de 1983, o Alto Volta Francês – um dos países mais pobres do mundo, marcado pela devastação do colonialismo francês – tornou-se Burkina Faso, ou “Terra dos Homens Retos”. As costas do povo burkinabe não deveriam mais ser curvadas sob a bota do colonialismo francês: em vez disso, eles se tornariam mais uma vez um povo orgulhoso e independente.

Como os revolucionários pan-africanos que o antecederam, Sankara entendeu que a verdadeira independência era mais do que uma nova bandeira – significava também independência política e econômica. Para esse fim, a liderança de Sankara foi caracterizada pela nacionalização, redistribuição de terras e programas expansivos de construção de ferrovias. A libertação das mulheres foi colocada na vanguarda da revolução, com Sankara argumentando que “a revolução e a libertação das mulheres andam juntas”.

As conquistas da revolução não podem ser subestimadas. Mais de dois milhões de crianças foram vacinadas em uma campanha de saúde pública, dez milhões de árvores foram plantadas para combater a desertificação e escolas e hospitais foram construídos em todo o país. Em apenas quatro anos, Burkina Faso se tornaria autossuficiente em alimentos: “aquele que te alimenta te controla”, diziam com sabedoria. Quando questionado sobre suas intenções revolucionárias pela Newsweek, Sankara declarou: “Nossa ambição econômica é usar a força do povo de Burkina Faso para fornecer, para todos, duas refeições por dia e água potável”. Acima de tudo, Sankara mostrou ao mundo que tudo isso era possível sem a “assistência” neocolonial do Fundo Monetário Internacional (FMI) ou do Banco Mundial (BM).

Seus ambiciosos programas foram acompanhados por uma abordagem pessoal que evitou as armadilhas oferecidas pelo poder: em vez disso, Sankara viveu uma vida humilde com um salário modesto, com poucos pertences pessoais em seu nome. Inspirado pelo revolucionário cubano Che Guevara, ele colocou sua posição no cenário mundial para expressar solidariedade com os “desgraçados da terra” – os povos oprimidos do mundo e aqueles engajados na luta anti-imperialista.

Ecoando o discurso de Guevara na ONU em 1964, o discurso de Sankara 20 anos depois enfatizou a solidariedade com “os milhões de seres humanos que estão em guetos porque sua pele é negra… os índios que foram massacrados… as mulheres em todo o mundo que sofrem com um sistema de exploração imposto a elas pelos homens” e mais uma multidão de povos oprimidos da Irlanda a Timor Leste. Sankara também reconheceu a importância da luta dos palestinos contra o colonialismo dos colonos: “Corajosos, determinados, estóicos e incansáveis, os palestinos nos lembram a todos a necessidade e obrigação moral de respeitar os direitos de um povo”.

Burkina Faso pode ter sido um país pequeno e pobre – mas Sankara sabia que a solidariedade internacional com aqueles que lutavam ao seu lado era primordial.

O período de retificação

Para aqueles familiarizados com golpes contra líderes socialistas africanos, a reversão que ocorreu após o assassinato não é surpresa. Depois que Sankara foi morto a tiros na capital do país, Ouagadougou, Compaoré começou a desfazer o progresso alcançado pela revolução: entidades estatais nacionalizadas foram privatizadas e Burkina Faso foi devolvido às garras do FMI.

Imediatamente após a morte de Sankara, as ondas de rádio foram inundadas com propaganda anti-Sankara que enquadrava o golpe como “retificação da Revolução” e rotulava Sankara de “traidor messiânico”. Mas poucas pessoas no terreno acreditaram nas histórias sobre o homem que viveu uma vida tão humilde, principalmente contadas por Compoaré e sua base de apoiadores, composta principalmente por velhas elites sociais e chefes tribais. A corrupção voltou a ser a ordem do dia e a repressão generalizada contra partidários de Sankara, jornalistas, ativistas estudantis e cidadãos comuns garantiu a sobrevivência do governo pós-golpe.

Os laços com o antigo opressor colonial, a França, também foram refeitos sob a liderança de Compaoré, que foi calorosamente recebido em Paris, em contraste com seu antecessor, e fortaleceu os laços com a Costa do Marfim e o Togo francófonos. O comandante dos assassinos de Sankara, Gilbert Diendéré (condenado à prisão perpétua), foi até premiado com a mais alta ordem de mérito da França, a Ordem Nacional da Legião de Honra.

Um legado vivo

Incapaz de acabar com a admiração generalizada por Sankara, no entanto, o governo de Compaoré o reconheceu como um herói nacional em 1991. Fora de Burkina Faso, também, sua integridade intransigente e as circunstâncias trágicas de sua queda renderam a Sankara uma popularidade que perdura até hoje. Um monumento dedicado a Sankara e outros heróis nacionais foi inaugurado em 2010, e o túmulo dele continua sendo um local de visitas constantes. No vigésimo aniversário de sua morte em 2007, a viúva exilada de Sankara, Mariam, retornou a Burkina Faso pela primeira vez e foi recebida por milhares de pessoas enquanto colocava flores no local de descanso de seu marido.

O espírito de Sankara estava novamente no ar 7 anos depois, quando um levante popular derrubou Compaoré do governo com sucesso após 27 anos no poder. A popularidade de Sankara em Burkina Faso aparece até na moda, com o dan fani – um tecido tradicional comumente associado ao sankarismo – amplamente usado após 2014.

A sentença de Compaoré é o fim de uma luta de décadas por justiça, por mais agridoce que seja. Sankara junta-se às fileiras de visionários africanos como Kwame Nkrumah e Patrice Lumumba, e a ideia de uma África unificada livre do controle neocolonial deriva lentamente para o terreno subjetivo do “que poderia ter sido”; Burkina Faso ainda é atormentado pela instabilidade política, evidenciada pelo golpe militar ocorrido em janeiro deste ano.

Além disso, o governo francês se recusa a reconhecer ter desempenhado um papel no golpe de 1987 e mantém documentos confidenciais relativos ao assassinato de Sankara a sete chaves. O presidente francês Emmanuel Macron prometeu a tirar o sigilo desses documentos em 2017, mas eles ainda não cumpriu sua promessa. Compoaré e seus cúmplices podem ter recebido justiça, mas os opressores coloniais que facilitaram seu golpe ainda não foram responsabilizados.

Em meio a esse quadro sombrio, no entanto, há uma luz de otimismo. A revolta de 2014 demonstra que Sankara pode estar morto, mas o sonho de um Burkina Faso independente, onde seu povo esteja orgulhoso, com as costas eretas, continua vivo. Como o próprio Sankara disse antes de seu assassinato: “As ideias não podem ser mortas, as ideias nunca morrem”. A sentença de Blaise Compaoré é um passo em direção à justiça – mas somente a libertação da África das mãos do neocolonialismo e um acerto de contas trazido às antigas potências coloniais podem trazer a verdadeira justiça que Sankara merece.

Sobre os autores

é estudante de mestrado na Universidade de Leeds e membro do Young Historians Project. Ele também faz parte do Grupo de Trabalho Editorial do History Matters Journal.

Cierre

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Published in Africa, Análise, Guerra e imperialismo and História

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