A Rússia atacou a Ucrânia na noite do dia 23 de fevereiro. O pior cenário foi confirmado. A extensão da invasão não está totalmente confirmada, mas já está claro que o exército russo ataca alvos em todo o país – e não apenas no Sudoeste, ao longo da fronteira das chamadas “repúblicas populares”. Na manhã do dia 24, ucranianos de diversas cidades acordaram com o som de explosões.
Vladmir Putin deixou claro o objetivo militar da operação: a rendição completa do exército ucraniano. O seu plano político permanece incerto – mas provavelmente é o estabelecimento de um governo pró-Rússia em Kiev. O líder russo espera que a resistência será rapidamente derrotada e que a maioria dos ucranianos aceitará obedientemente o novo governo. As consequências sociais para a própria Rússia serão severas – já no dia 24, antes mesmo do anuncio das sanções ocidentais, as bolsas de valores russas colapsaram e a queda do rublo quebrou todos os recordes anteriores.
O discurso de Putin que anunciou a guerra na noite do dia 23 representou, sem dissimulações, a linguagem do imperialismo e do colonialismo. O Kremlin não é mais capaz de esconder atrás de outras queixas – incluindo a expansão da OTAN – seu desdém à Ucrânia e seu desejo de puni-la. Essas ações ultrapassam os compreensíveis “interesses” racionais e se localizam no campo da “missão histórica”, assim interpretadas por Putin.
Desde a prisão de Alexei Navalny em janeiro de 2021, a polícia e os serviços de segurança destruíram a oposição organizada na Rússia. O grupo de Navalny foi dissolvido após ser considerado “extremista”; com as manifestações em sua defesa, cerca de quinze mil pessoas foram detidas, enquanto os meios de comunicação independentes foram fechados ou tiveram seu funcionamento severamente limitado após serem classificados como “agentes estrangeiros”. Manifestações em massa contra a guerra são improváveis – não há força política capaz de coordená-las. Além disso, a participação em qualquer protesto de rua é severa e rapidamente repreendida. Após esses eventos, grupos de ativistas e intelectuais russos foram ameaçados e desmoralizados.
Um sinal tranquilizador é que não existe um claro apoio a guerra por parte da sociedade russa. De acordo com a Levada Center, última agência ativa de pesquisa independente (e rotulada de “agente estrangeiro” pelo governo russo”), 40% dos russos não apoiam o reconhecimento oficial das “repúblicas populares” de Donetsk e Luhansk pelas autoridades russas, contra 45% que se coloca a favor. Alguns sinais de “apoio a bandeira” são inevitáveis, mas é evidente que o Kremlin é incapaz de fomentar o entusiasmo pela guerra – apesar de seu total controle sobre os principais veículos de comunicação e a dramática efusão de propaganda demagógica na TV.
O que está acontecendo hoje não é nada parecido com a mobilização patriótica que ocorreu em 2014, após a anexação da Crimeia. Nesse sentido, a invasão da Ucrânia refuta a conhecida teoria de que a agressão externa do Kremlin visa sustentar sua legitimidade interna. Pelo contrário: essa guerra pode desestabilizar o regime russo e até ameaçar a sua sobrevivência, visto que o “problema de 2024”, isto é, estabelecer um discurso convincente que sustente a reeleição de Putin, ainda é real.
A esquerda mundial precisa se unir em torno de uma mensagem simples: não à invasão russa na Ucrânia. Não há justificativas para a continuação das ações da Rússia, que resultam apenas em sofrimento e morte. Nesses dias de tragédia, apelamos à solidariedade internacional com aos refugiados ucranianos.