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Desde a sua tomada de posse, em janeiro, Lula da Silva tornou-se a principal voz mundial na exigência de justiça climática e na oposição à guerra. (Foto: Andressa Anholete/Getty Images)

Nossa luta por justiça é internacional

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Tradução
Sofia Schurig

As reivindicações de Lula por justiça climática e diplomacia multipolar em relação à guerra na Ucrânia provocaram reacionários e irritaram o status quo no Ocidente. Esses ataques sinistros são um aviso dos perigos que os socialistas no mundo estão correndo se não conseguirem apoiá-lo.

Lula da Silva discursou no evento Power Our Planet, em Paris. O presidente brasileiro prometeu que “até 2030, o desmatamento da Amazônia chegará a zero”, acrescentando que seu governo “será implacável contra qualquer um que derrube uma única árvore para cultivar soja, milho ou criar gado”.

A Amazônia, continuou, “está em território brasileiro, mas também pertence a toda a humanidade, e é por isso que faremos tudo o que estiver ao nosso alcance para manter a floresta em pé”. Assim, diante dos aplausos de milhares de pessoas que o aclamavam como uma estrela do pop, ele pediu aos jovens de toda a Europa que garantam que os países ricos financiem reparações climáticas para o Sul Global.

Essa intervenção é típica da nova agenda internacional de Lula. Desde sua posse, em janeiro, ele visitou onze países e participou de uma série de cúpulas e reuniões internacionais nas Américas, Ásia e Europa. Isso tem deixado algumas pessoas desconfortáveis, tanto dentro como fora do Brasil.

Parte disso se deve ao fato de ele ter ousado discutir temas que algumas pessoas acham que não são de sua conta, como a guerra na Ucrânia. Afinal, como um presidente sul-americano pode pensar que tem alguma palavra a dizer nos assuntos europeus?

Na semana passada, em Roma, Lula disse a jornalistas que a esquerda europeia precisava encontrar sua voz e “reconstruir utopias” para os jovens poderem sonhar e lutar por um futuro melhor. Ele afirmou que a esquerda deve defender os refugiados e a liberdade de movimento, evitar a timidez diante da extrema direita e estar ciente de suas responsabilidades no Norte Global, antes de pedir diplomacia em relação ao militarismo e criticar jornalistas por não se importarem com Julian Assange.

Ele também enfatizou o direito de cada nação à autodeterminação e a necessidade de os países respeitarem as democracias dos outros.

Essas intervenções têm gerado controvérsias. Em 21 de junho, o Financial Times publicou um artigo descrevendo o papel dos EUA na “defesa da democracia brasileira”, garantindo que Bolsonaro e seus apoiadores militares aceitem os resultados das eleições de 2022.

Não é surpreendente que a “intromissão leve” do vizinho do norte do Brasil não tenha sido motivada por sentimentos de solidariedade ou respeito à democracia, mas sim por sua própria dinâmica interna, uma vez que um movimento bem-sucedido de “a eleição foi roubada” por Bolsonaro poderia ter dado a Trump e seus apoiadores um impulso renovado — e, possivelmente, bem-sucedido.

Também há rumores de influência do governo americano antes mesmo das eleições gerais brasileiras. A verdadeira pergunta é: como essa história estava circulando há meses e foi amplamente coberta por publicações como o Brasilwire, por que o Financial Times publicou esse artigo agora? O próprio artigo nos dá algumas pistas em sua conclusão: a administração americana está bastante insatisfeita com o desempenho internacional de Lula e sua “falta de gratidão”.

Certamente, quando Lula está disposto a cooperar em questões ambientais e expandir o comércio com os Estados Unidos e países europeus em seus próprios termos, as coisas vão bem. Mas quando ele ultrapassa os limites e retorna da China com enormes acordos comerciais, se declara porta-voz dos países em desenvolvimento (inclusive em relação à guerra na Ucrânia, da qual ele se recusa a apoiar), ou discute questões constrangedoras para os líderes ocidentais, como a relação de dívida do mundo rico com o restante do mundo ou a situação dos refugiados, as coisas azedam.

Mesmo comentaristas de esquerda parecem incomodados com o desempenho internacional de Lula. Em Novara, Joana Ramiro conclui seu artigo pessimista sobre o desempenho ambiental de Lula afirmando que, para derrotar a bancada do agronegócio no Congresso, Lula deve conter suas ambições internacionalistas.

Essa é uma conclusão estranha, considerando que o sucesso ambiental de Lula em casa está íntimo à pressão internacional por ações ambientais. Caso contrário, como ele poderá enfrentar os apoiadores políticos do agronegócio, que incluem 300 dos 513 congressistas, incluindo um poderoso presidente da Câmara?

Como ele lidará com uma mídia pouco receptiva, forças de segurança rebeldes, uma onda de notícias falsas impulsionadas pela operação de Bolsonaro e estimada como acreditada por um quarto da população do Brasil, e um Banco Central independente do governo e hostil ao seu programa de esquerda?

Nem mesmo o talento político de Lula pode resolver tudo isso. É por isso que ele precisa de apoio internacional e financiamento para políticas ambientais e indígenas. Bons acordos comerciais são necessários para contrabalançar a sabotagem da economia brasileira pelo banqueiro central de Bolsonaro.

E, apesar das previsões pessimistas, a economia do Brasil está crescendo. O emprego está aumentando, a inflação está baixa e Lula começou a reduzir o desmatamento, que diminuiu 31% em comparação com o período homólogo.

Apesar dos melhores esforços do Congresso brasileiro para enfraquecer a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e a ministra dos Assuntos Indígenas, Sonia Guajajara, novos funcionários estão sendo contratados para fortalecer esses órgãos. Penalidades por desmatamento estão sendo aplicadas, Lula vetou algumas das mudanças introduzidas pelo Congresso e parcerias estão sendo feitas com outros ministérios para garantir que as políticas que ele idealizou continuem avançando.

Infelizmente, a chamada “crise interna” da política brasileira continuará, dada a força da Direita dentro e fora do Congresso — um legado do golpe contra a presidente Dilma Rousseff, o surgimento da extrema-direita e o governo de Bolsonaro. Isso significa que o governo atual terá que ser constantemente inventivo para ter sucesso.

No entanto, desistir de suas ambições internacionais não são o caminho a seguir. Nem para o Brasil, nem para o mundo. Não há vozes tão progressistas, razoáveis ou corajosas no cenário político atual como a de Lula. Ele é a única grande figura política atualmente disposta a dizer o que precisa ser dito para um futuro sustentável, progressista e que busca soluções genuinamente cooperativas para os desafios sombrios e profundos de nosso tempo. Aqueles de nós nos movimentos progressistas devem lembrar disso, pois os ataques a ele certamente aumentarão.

Sobre os autores

Júlia Felmanas

é intérprete, tradutora e coordenadora da sucursal londrina do Partido dos Trabalhadores do Brasil.

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Published in América do Sul, Análise, Capital, Ecologia and Europa

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